sábado, 31 de outubro de 2009

CEMITÉRIOS FERROVIÁRIOS

Uma "minissaia" ainda em tempos de Sorocabana, com a tradicional cor verde da ferrovia. Acervo ABPF

Mais uma péssima notícia para os preservacionistas ferroviários e para o patrimônio ferroviário nacional. As locomotivas elétricas da bitola métrica que estão em Sorocaba vão ser removidas, pois estão atravancando os desvios do pátio da estação. Até acredito. Afinal, desde a desativação da tração elétrica no Estado (à exceção das linhas da CPTM e do pátio de Paranapiacaba), as locomotivas elétricas que foram da Sorocabana, Paulista e FEPASA foram encostadas em diversos pátios pelo Estado.

Araraquara tem uma V-8 na carcaça ali próxima à estação. Bauru tem uma russa em péssimo estado. Há outra Russa nas antigas oficinas de Jundiaí. Há uma “baratona” numa praça em Jundiaí, enferrujando e sendo pichada há anos. Há duas “francesas” em Mairinque, guardadas, mas em condições precárias. E há “Lobas”(GE/Westinghouse EUA 1-C+C-1 série 2000/2050) e “minissaias” (GE Brasil B-B série 2100) em Sorocaba. São estes últimos dois modelos que serão transportadas de lá para o “cemitério” de Triagem, em Bauru.

Segundo se apurou, o DNIT teria dado autorização à concessionária do trecho para remover essas locomotivas para lá. O problema é que Triagem é como um campo de concentração com fornos crematórios: o que vai para lá vira sucata mais rápido do que em qualquer outro pátio.

Estive em Triagem, que é a última estação para a linha de bitola larga para quem vinha de trem de São Paulo, antes da estação de Bauru. Fica em campo aberto, ao lado da rodovia Raposo Tavares. A última vez que lá estive foi exatamente um ano atrás. O que vi dava pena. Diversas LEWs totalmente destruídas. Carros de passageiros, vagões, a própria estação, tudo amassado, enferrujado, cortado. Ao Deus-dará.

Ninguém se preocupa em proteger os materiais: as Russas e as V-8 que lá estiveram foram já todas cortadas e viraram sucatas. Escapou uma, que, sabe Deus como, conseguiram levar para a estação de Bauru. O que quero dizer é: o DNIT autorizou a concessionária ALL a mandá-las para o sucateamento. O curioso é que estas locomotivas já deveriam ter sido vendidas como sucata ou mantidas em condições de uso, mas ninguém se preocupa com isso.

Uma pessoa, minha conhecida, que soube ontem da decisão, tentou manter uma das Lobas e uma das Minissaias em Sorocaba, para preservação. Não lhe deram ouvidos e isso não deverá acontecer. Para os preservacionistas, isto é péssimo. Para o DNIT e Inventariança da RFFSA, também, pois dia a dia a sucata valerá menos. Ou seja, o País perderá de qualquer forma.

Não esperemos que se preservem todas as locomotivas que já funcionaram. Claro que não. Mas pelo menos uma de cada dessas que fizeram a história de São Paulo e do País deveria ser mantida. Nem que seja para ficar exposta protegida num museu (já que trafegar com locomotivas elétricas é impossível sem a rede aérea).

Se nada for feito para impedir que isso aconteça, mais uma vez locomotivas de valor histórico ou mesmo de valor de venda serão condenadas por desleixo e despreparo.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

OS GIESBRECHTS CHEGARAM FINALMENTE A PARACATU!

Estação de Dores do Indaiá, na E. F. Paracatu, quando ainda tinha trens e trilhos

No dia 18 de dezembro de 2007, escrevi para meus amigos e colegas de listas de discussão na Internet a seguinte mensagem:

Senhores:

Tenho a grata satisfação de informar a todos que a família Giesbrecht finalmente chegou a Paracatu, com 117 anos de atraso, mas chegou.

Em 1890, um dos primeiros, senão o primeiro, emprego de meu bisavô Wilhelm (Guilherme) Giesbrecht depois de chegar ao Brasil, então com 24 anos de idade, foi o de fazer a pesquisa para o leito da E. F. Paracatu, que ligaria a E. F. Central do Brasil, na região de Sabará (Belo Horizonte ainda não existia) à cidade de Paracatu, antiga cidade mineira fundada por bandeirantes paulistas e hoje próxima à divisa com Goiás, a 220 km de Brasília.

Anos mais tarde, Wilhelm voltou a trabalhar para a construção da ferrovia, no final dos anos 1890. Esta, no entanto, chegou apenas em 1937 à estação da Barra do Funchal (município de Serra da Saudade, Minas Gerais), dali não passou e jamais chegou a Paracatu, embora mantivesse seu nome e depois ter sido encampada pela Rede Mineira de Viação, em 1934.

Hoje exatamente às 13 horas meu filho Filipe, trineto de Wilhelm, chegou a Paracatu, vindo de Brasília pela BR-040, sendo o primeiro e o único até agora da linhagem a conhecer a cidade.

Palmas para ele.

Abraços, Ralph Giesbrecht


Filipe foi para lá a trabalho. Fez um trajeto bem diferente do que Wilhelm faria na época: São Paulo-Brasília de avião, alugando um carro em Brasília e seguindo para Paracatu. Permaneceu ali por quase uma semana, retornou pelo mesmo trajeto e jamais foi para lá novamente, mas a “missão” foi cumprida.

A Estrada de Ferro de Paracatu ficou com o nome da cidade aonde nunca chegou. Já foi extinta há anos e teve os trilhos arrancados.

Menos de um ano mais tarde nasceu Guilherme Giesbrecht, chamado de Willi, filho de Alexandre, sobrinho de Filipe e meu neto.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

O BOTA-ABAIXO EM PINHEIROS

Embora trabalhe próximo ao largo de Pinheiros, em São Paulo, quase não passo por ele. O trânsito ali é um inferno, o local é bastante deteriorado e, hoje reparei, a ruas em volta dele estão cheias de buracos – verdadeiras panelas. Bom, como já deu para perceber, hoje passei por ali de carro. Duas vezes, vindo pela rua Paes Leme da Marginal do Pinheiros e seguindo até entrar à direita na avenida Faria Lima.

E vi que as velhas casas e lojas que existiam nas esquinas das ruas Paes Leme e Fernão Dias (esta esquina fica em frente ao largo e à igreja) e, um pouco mais à frente, as da esquina das ruas Cardeal Arcoverde (lado ímpar) e Teodoro Sampaio (lado par), estavam sendo demolidas. Até um prédio de apartamentos, provavelmente de uns oito andares, vai “dançar” ali.

Suponho que seja por causa do metrô – a estação Largo da Batata ficará ali. O que farão ali não sei, se por acaso será parte de uma praça maior, ou de alargamento da Teodoro Sampaio, se surgirão (argh!!!!) novas construções...

Jamais prestei muita atenção nas casas que havia por ali e que agora se transformaram num monte de entulho. Sei, no entanto, que eram antigas, a maioria provavelmente com pelo menos 70 anos de idade. Se jamais me chamaram a atenção, não deviam ser grandes coisas em termos de arquitetura, talvez com exceção de alguns dísticos e brasões.

Na foto acima, tirada evidentemente do Google Maps, a rua que corta a foto é a Teodoro Sampaio. Pode-se ver na extrema esquerda parte do largo de Pinheiros e a primeira rua que aparece, seguindo para o norte, é a Fernão Dias. A segunda rua, em diagonal, é a Cardeal Arcoverde. Todos os prédios dos quais se vêem os telhados no lado norte (par) da Teodoro Sampaio, entre a Fernão Dias e a extrema direita da foto, onde as partes brancas são parte das obras do metrô e da nova estação, estão em demolição hoje. Sobraram em pé apenas parte de um velho predinho na rua Cardeal Arcoverde (provavelmente o de telhado com telhas de barro isolado na foto) e o prédio alto da direita, cuja demolição ainda não se iniciou.

A quantidade de entulho atrás das cercas de madeira é bastante o suficiente para que se as vejam da rua. Independentemente da arquitetura, é mais uma parte da velha São Paulo que se vai, embora com deterioração bastante aparente até a demolição. Os prédios do lado ímpar da Teodoro seguem em pé até segunda ordem ou até o dinheiro chegar...

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

SOBRE O TAV

Trem rápido alemão, 2008

Uns o chamam de trem-bala. Outros de TGV. Alguns de TAV. Nem vem ao caso o que significa cada abreviatura, mas sim de saber: ele é necessário? Em minha opinião, é, sim (aliás, não confundir TGV com o trem de capina química que a ALL chama de “trem de gestão de vegetação” – ou seja, uma composição que tem pelo menos um vagão de herbicida que à medida que o trem alcança jorra o mesmo pelos trilhos para eliminar mato na linha – e que os funcionários chamam de TGV).

Há diversos artigos circulando quase todos os dias em revistas, jornais e na Internet acerca do TAV, que é o trem que ligaria Campinas ao Rio passando por São Paulo e que vem sendo discutido desde os anos 1970. Já se gastou muito dinheiro com ele, mesmo ele nunca tendo rodado um centímetro por aqui. São os custos dos estudos de viabilidade, que já encheram o bolso de muita gente.

Especialmente nos últimos três ou quatro anos, o trem-bala, com o nome que se quiser dar a ele, voltou às páginas dos jornais. Na verdade, os últimos treze anos, ou seja, desde a privatização das ferrovias, marcaram o ressurgimento da ferrovia no Brasil, embora esse renascimento tenha sido mais no número de linhas escritas do que em fatos reais e quilômetros construídos.

Hoje li um artigo de um professor e consultor sobre o tema. Ele é pessimista e faz várias críticas ao projeto. Ele tem razão em algumas. Mas para mim ele jamais pode dizer algo do tipo “num momento em que há tantos problemas com transporte público no Brasil, quer-se construir um trem de alta velocidade” (não são essas exatamente as palavras dele). Ora, por que não? É a mesma coisa que dizer que não se pode gastar dinheiro num determinado projeto porque há tanta fome no mundo. Há mesmo, mas nem por isso vai-se gastar todo o dinheiro existente para saciar a fome no mundo.

E eu acho o projeto necessário, sim. Se vai sair não sei. Mas que se precisa de uma alternativa aos aviões para ir do Rio a São Paulo, precisa-se. Afinal, carros e ônibus levam mais de 5 horas a velocidades aceitáveis para fazer o percurso. Um TAV leva bem menos. Preço da passagem? Eles – quem ganhar o contrato, se é que um dia alguém o ganhará – que estudem algo que seja viável.

E nós precisamos parar de ser pessimistas com tudo. Não temos experiência com esse trem? Outros têm. Há uma serra entre as duas cidades que dificulta tudo? Que a análise conclua de vez se dá ou não dá para ter um TAV. Certamente não serei eu a dar as respostas, nem tenho pretensão ou conhecimento para tanto. Agora, somente meter o pau não ajuda nada, e desse jeito jamais vamos saber se ele é pelo menos viável para ser construído, o que resultaria numa constante volta ao assunto e mais gastos com o seu projeto... ad eternum, sem que nada saia do papel.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

TRISTEZA SOBRE TRILHOS

A estação de Lobo em 2001. Foto Adriano Martins
Algumas das últimas notícias sobre ferrovias mostram que os fatos que acontecem no dia-a-dia não são sempre agradáveis para quem gosta delas e acredita que muita coisa boa poderia ser oferecida ao País se houvesse mais educação e uma mínima política nacional que fosse para o setor de transportes.

A primeira delas não é tão nova assim. Num esquecido lugarejo do interior de São Paulo, o distrito de Lobo (município de Itatinga), a velha estação construída na primeira década do século com um estilo bem Sorocabana da época – e desativada em 1952 por causa de uma retificação de linha na região – foi demolida. Servia como escola havia um bom tempo. Estive em Lobo apenas duas vezes, entre 1998 e 2001. Fotografei o pequeno prédio, já sem trilhos ao lado. Meu amigo Adriano também esteve lá pelo mesmo motivo, além do fato de ter sido ali que seus avós se casaram, no tempo da linha.

Talvez pelo fato de o prédio ser pequeno demais para uma escola, construíram outro maior a cerca de 30 metros dele – e demoliram o prédio centenário. Quem autorizou isso? Quem não o queria ali? Em que ele atrapalhava? No seu lugar não foi construído absolutamente nada, e a grama em volta continua abrigando coisa alguma. Até a plataforma de pedras desapareceu. Como a escola era pública, o prédio também devia ser. Portanto, salvo desmentido, foi mesmo coisa de político.

De Belo Horizonte vem a notícia que o ramal de Águas Claras, construído nos anos 1970 e já desativado há mais de dez anos (!!!) será transformado em uma avenida. Meu Deus, como os prefeitos adoram avenidas. Aproveitar o leito para colocar transporte público sobre trilhos, nem pensar.

De Três Lagoas, Mato Grosso do Sul, a notícia que chega é que a ALL “colocará nos trilhos, de 27 a 29 de outubro, o “Vagão do Conhecimento”. No passeio de trem, jovens de escolas municipais de Três Lagoas (MS) terão oficinas de reaproveitamento de material reciclável, aulas de informática e palestras educativas”. Que enorme tristeza achar que um passeio de trem feito eventualmente com diversas crianças uma ou duas vezes por ano pode substituir a alegria de se tomar um trem no dia e na estação que se quiser, como acontecia antigamente.

É o caso de se repetir o velho chavão “me engana que eu gosto”. Tiraram o direito dos brasileiros do transporte por trilhos (com exceção das pouquíssimas exceções conhecidas). Em 1960 havia mais de 37 mil quilômetros de trilhos percorridos por bons e maus trens de passageiros, mas que lá estavam todos os dias, com todas as virtudes e defeitos que eles pudessem ter. Hoje, são apenas pouco mais de 2.500 quilômetros, contando os quatro trens de longo percurso sobreviventes (1800 km), os metropolitanos (800 km) e esquecendo os turísticos, que não são regulares.

Enquanto isso, diversos países do mundo, ricos e pobres, mantêm seus trens de passageiros porque sabem que eles têm sua função na vida das pessoas. Aqui... bom, aqui, políticos e empresas não se importam com as pessoas.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

VIVER SEM ELETRICIDADE

Até o século 19, todas as pessoas do mundo viviam sem eletricidade. Como não a conheciam, não lhes fazia falta. Ora, não havia computador, televisão, cinema, máquinas de lavar roupa, automóveis, iluminação pública nem residencial. As indústrias tinham motores que funcionavam com máquinas a vapor, assim como as ferrovias.

Dormia-se cedo e, se queriam sair durante à noite, as pessoas passeavam pelas ruas e praças das então pequenas cidades, a pé mesmo, fossem ricas ou pobres, onde havia a iluminação da lua cheia em alguns dias e alguns pontos onde tochas – e depois a iluminação a gás ou óleo de baleia – davam uma certa iluminação para não se ficar no mais profundo breu.

Sim, o breu, que ainda existe nas noites em que passamos eventualmente em pequenas casas de fazendas, onde apagamos a luz para dormir e a iluminação do lado de fora não existe ou está muito distante. Abre-se os olhos dentro de casa e não se enxerga nada... em algumas noites, mesmo fora ver alguma coisa na escuridão é quase impossível.

Um dia descobriu-se e colocou-se em uso a eletricidade. A lâmpada elétrica de Tomas Edison começou a iluminar as casas e ruas, apagando os lampiões a gás e as velas. É verdade que a eletricidade e a iluminação vieram aos poucos, começando pelas cidades, no final do século 19. Primeiro nas grandes capitais, depois nas cidades menores. Em São Paulo chegou em 1900, mas é verdade que antes disso já havia alguma iluminação elétrica proveniente de pequenas usinas a gás. Em Santana de Parnaíba, veio em 1904. Em muitas cidades do interior, veio na primeira década do século 20 e continuou vindo pelas décadas seguintes.

No início, havia luz e eletricidade somente em parte do dia, sendo cortada pela fornecedora às 8 da noite e reacendida na manhã do dia seguinte. Em Parnaíba, por exemplo, somente em 1946 a eletricidade passou a ser contínua, 24 horas ao dia. Em cidades menores, pequenos sítios ou fazendas no interior também, era muito comum, mesmo nos anos 1970, a eletricidade existir durante a noite, mas “faiscando” como velas que diminuíam e aumentavam a chama.

Hoje em dia, creio que não há parte do Brasil – ou se há, são poucas – que não tenham eletricidade. Isso é possível, pelo menos no Brasil, porque a maioria da força vem de rios represados que formam barragens cada vez maiores para que possam gerar cada vez mais energia elétrica. Hoje, ninguém quer que isso deixe de existir. Não se consegue mais viver sem energia elétrica – basta ver o mau humor das pessoas quando acaba a luz em casa por causa de alguma falha no fornecimento.

Discute-se todos os dias nos jornais o quanto cada nova usina – elas não param de ser projetadas – vai afetar o meio ambiente onde vão ser construídas. Todos querem impedir sua construção, mas ninguém quer ficar sem luz. Hoje li algo sobre a energia eólica em Camocim, no Ceará, que, apesar de “limpa”, como se diz, arrasa com uma grande área provocando uma série de transtornos. As usinas hidrelétricas afetam o meio ambiente, claro. Ídem as nucleares, como a de Angra, estas por causa da questão de onde se colocar o lixo atômico e do perigo de um vazamento ou uma explosão de material radioativo. Energia solar é caríssima quando gera eletricidade.

O que fazer? Para os ecologistas que acham que podem viver sem ela, proponho criar uma área e que seja oferecida para eles e suas famílias se mudarem. Ali você poderia ter tudo o que quisesse – mas não teria eletricidade. Já pensaram doar uma área inteira do tamanho de um Estado médio brasileiro para se viver sem eletricidade? Afinal, não estou falando de pequenas comunidades que até podem existir e eu não saiba, como a dos quakers americanos.

O pior é que mesmo que isto fosse aceito e realizado, o número de pessoas e o tamanho da área sem eletricidade não seriam suficientes para se ter uma grande baixa na necessidade de novas construções de usinas de energia – sejam lá geradas por que matéria-prima for.

Enfim: destruiremos o mundo até onde for possível. O problema é se passarmos deste ponto e não percebermos. Pior do que isso, somente se descobrirmos de repente que esse momento já passou há anos...

domingo, 25 de outubro de 2009

PUNIDO SEM SABER POR QUÊ

Deste ponto ao lado do Pateo do Colegio partimos nós em 2006 no passeio turístico. Não necessariamente nesse tróleibus.
Em 2006, eu vários amigos fomos passear de ônibus elétrico no aniversário de São Paulo. Antes que qualquer leitor ache esse passeio estranho, vou lembrar que, além de tudo, ele era de fim turístico. Afinal, esses ônibus não passam de um trem com trilhos... aéreos, não é verdade?

Depois da viagem, cinco dias mais tarde, enviei um e-mail ao jornal O Estado de S. Paulo. Não me lembro se chegou a ser publicado ou não. A transcrição está abaixo.

No último dia 25 de janeiro, fui com uma turma de amigos fazer o passeio turístico oferecido pela Prefeitura em ônibus elétricos. Partiam do Pateo do Colégio, rodavam pelo velho centro e voltavam ali, depois de uma parada na Praça Ramos. Foi um prazer andar em ônibus bons, silenciosos, confortáveis e não poluentes ao invés dos nossos famosos e meio maltratados ônibus diesel, fumarentos e não muito asseados. Na administração anterior a prefeita estava maluca para acabar com os tróleibus. Diziam que eram ultrapassados (???) e que quem gostava deles eram saudosistas. Pois bem, havia filas no Páteo do Colégio para andar nos tróleibus pelo dia inteiro. A prefeita não conseguiu acabar com eles, mas acabou com três linhas importantes. As outras, por causa de alguma pressão, foram mantidas. E precisamos convencer as ainda renitentes pessoas da atual Prefeitura que esse é o transporte que nos interessa. Se não dá para tê-los por toda a cidade, que se os tenham pelos maiores trajetos possíveis. Chega de barulho e de fumaça. Que nossos políticos ponham na cabeça que o negócio são ônibus elétricos e trens metropolitanos, mesmo. O resto é simplesmente o que sobra, pois é evidente que não se pode pôr tróleibus e trens em todas as ruas. Que lhes baixe a luz sobre suas cabeças, e que não ocorra o que aconteceu em Santos, Ribeirão Preto, Araraquara, Recife e várias outras cidades, onde os tróleibus foram nocauteados por pura ignorância”.

É interessante notar que na época o Prefeito já era o José Serra, que renunciou pouco depois para concorrer ao Governo do Estado. Mas, até onde eu saiba, nenhum tróleibus foi desativado depois da prefeita de nem-um-pouco-saudosa memória. Certamente não foi por causa do meu e-mail, mas ele deve ter ajudado alguma coisa se chegou a ser a ser publicado no jornal. Cidades como Niterói e Rio de Janeiro também tiveram os elétricos por algum tempo – pouco – e Santos ainda tem um – um!

Um dos comentários dos inimigos dos elétricos é que ele polui visualmente a visão aérea por causa de seus fios... concordo que o excesso de fios que existem na cidade contribui para enfeiá-la, mas ele é o único fio que não se pode enterrar... os outros podem (eletricidade, telefone, tv a cabo) ser enterrados e somente o foram na região da baixa Rebouças, partes do centro velho e na rua Oscar Freire. Dizem que é uma operação cara. Deve ser, mas gasta-se dinheiro com um monte de bobagens, por que não com o seu enterramento? Agora, cancelar tróleibus porque eles poluem visualmente e não pensar no conforto de não se ouvir barulho algum, ao contrário dos ônibus a diesel, é ser cego, mentiroso ou ter má vontade.

Aliás, é de se notar que na rua da Boa Vista, no centro velho, onde passam elétricos, há os postes antigos dos anos 1940 postos ali para segurarem os fios do tróleibus, que foram abandonados para que os fios fossem pendurados em outros postes mais novos. E os velhos, mais bonitos, ficaram ali sem serventia alguma. Isto também não é poluição visual?

sábado, 24 de outubro de 2009

PASSEIO DE ÔNIBUS NUM SÁBADO

Em 1905, a região pela qual o ônibus trafega hoje nem existia... e o bairro
Cerqueira Cesar era o que hoje é o Sumarezinho.

Fui esta tarde ao “mercado das pulgas” da praça Benedito Calixto, em Pinheiros. Fiquei lá pouco tempo, conversei com uns conhecidos e dali deveria me encontrar com a Ana Maria na rua Tavares Bastos, na Vila Pompéia. Fui de ônibus. Tomei o primeiro que subia a Teodoro Sampaio. Na hora de pagar, não havia jeito de aceitar o bilhete único. Aí o cobrador me disse por que: o ônibus era intermunicipal (e portanto mais caro). Estava escrito isso do lado de fora do ônibus? Não, não estava.

Desci na rua Cardeal Arcoverde, logo depois que o ônibus saiu da Doutor Arnaldo para desce-la. Subi de volta à avenida e andei até o primeiro ponto, pouco antes da rua Cardoso de Almeida. Passou o ônibus “Pompéia”, mas não parou. Aí uma das pessoas que esperavam ônibus no ponto disse-me que ali somente paravam os ônibus que desceriam a Cardoso de Almeida. Eu teria de me dirigir ao ponto seguinte, nas mesma avenida, após o cruzamento. Essa informação estava escrita ali em algum lugar? Não, não estava.

Vai mal o sistema de transportes, pelo menos os de ônibus, em São Paulo.

No ponto seguinte, peguei o ônibus que ia para a Lapa e Perus, porque na última hora consegui ler que ele passaria na avenida Alfonso Bovero. Mesmo assim, antes de subir, perguntei ao motorista se ele passava por ela e ele confirmou. Subi. O ônibus seguiu em frente, mas não continuou na Doutor Arnaldo, entrou à esquerda na rua Heitor Penteado. Aí eu achei o roteiro, rua por rua, sobre a porta de saída e fui lendo. Ele realmente retornaria à Doutor Arnaldo pela rua Apinagés, mas antes de chegar a ela ele dava outra volta, entrando na Alfonso Bovero pelo início.

Muito estranho. Muitas voltas por ruas estreitas e cheias de ladeiras. Será que compensa financeiramente? Para os passageiros, certamente, uma encheção de saco. Desci na esquina da rua Diana e andei um quarteirão e pouco para chegar no endereço da rua Tavares Bastos. Esses trajetos de ônibus cheios de curvas inúteis são espantosos. Certamente em horas de mais tráfego ajudam a congestionar a região.

Reclamações minhas à parte, passei por alguns trechos de ruas por onde não passava havia muitos anos. Prestei atenção em pequenos detalhes pelo caminho, mas o que mais me agradou foram as construções antigas que existem no velho pátio do reservatório da SABESP na esquina das avenidas Doutor Arnaldo e Alfonso Bovero, em frente ao velho edifício que abrigava a extinta TV Tupi. Como sempre passava por ali de carro, nunca tive tempo de reparar além-muros nos detalhes antigos e muito bem conservados das edificações ali dentro.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

A GUERRA DO KAISER

A Primeira Guerra Mundial era chamada por minha avó Maria, que viveu esse período, de “Guerra do Kaiser”. Só isto já mostra o que os brasileiros, pelo menos, pensavam acerca de quem era a principal figura na guerra. No entanto, ela começou com uma declaração de guerra e imediato (no mesmo dia) bombardeio das tropas austro-húngaras a Belgrado, capital da Sérvia em 28 de julho de 1914.

Não vamos julgar aqui os motivos que levaram à guerra. Os impérios Centrais, ou seja, a Alemanha, a Áustria-Hungria, a Bulgária e o Império Otomano (Turquia), cada um com um Imperador (Kaiser, em alemão), uniram-se para combater os Aliados: Grã-Bretanha, França, Rússia czarista e outros menores. Ficando no meio dos Aliados, a Alemanha tinha de lutar em duas frentes: a francesa a oeste e a russa a leste.

A Guerra prosseguiu pelos quatro anos seguintes, para terminar abruptamente em 11 de novembro de 1918, com a derrota dos Impérios Centrais. A Alemanha, que ainda tinha forças, já havia derrotado a Rússia havia quase um ano e feito com ela um tratado que deu à primeira uma vasta área desde o mar Báltico até o mar Negro. Lutando em somente uma frente, preocupava-se em ganhar a Guerra contra seus cansados adversários a oeste.

O problema alemão foi que o Marechal Ludendorf apavorou-se quando no final de outubro seus cansados aliados se renderam e ofereceram aos Aliados, que já contavam com forças americanas, sua infraestrutura de transportes. Sem forças para combater uma eventual ataque por uma frente que não existia antes – a Sul – Ludendorf pediu um armistício, que os Aliados somente aceitaram quando o Kaiser renunciou, “na marra”, em 9 de novembro.

O que me levou a escrever este artigo foi o fato de que alguns dias atrás achei por acaso na Internet um trabalho em inglês muito interessante que analisava o possível cenário europeu caso a Alemanha houvesse ganhado a Guerra – o que ela esteve muito próxima de fazer. Curiosamente, ele chegou à conclusão de que pouca coisa mudaria, por vários motivos que ele analisava um a um. Por exemplo, a Áustria-Hungria e o Império Otomano desmembrar-se-iam da mesma forma em diversos países, pois já estavam em processo de separações internas desde praticamente o começo da Guerra. A Alemanha provavelmente manteria seu território anterior à Guerra, mas teria dificuldade em manter seus territórios conseguidos da Rússia, vasto demais e com povos separatistas internamente.

A França e a Inglaterra poderiam manter seus governos da forma em que eram, mas sofreriam maior pressão por causa do marxismo emergente na Europa nessa época. A Rússia, no final da Guerra, já era a União Soviética, o Czar e sua família já haviam sido assinados, portanto, não deveria haver grandes mudanças...

Enfim, hipóteses que jamais poderão ser provadas.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

LENDAS URBANAS

Ontem li uma reportagem sobre o relojoeiro que dá manutenção ao relógio da estação ferroviária (fechada há anos) de Paranapiacaba. Embora essa estação tenha substituído a outra, muito mais bonita, de 1901 e que teve de ser parcialmente derrubada por causa da retificação de uma linha da Santos-Jundiaí naquele pátio, o relógio foi retirado da torre e recolocado em outra torre da estação nova (e feia) do local. É um relógio antigo. A mesma reportagem diz que o relógio é uma réplica do Big Ben de Londres.

Como se pode ver pelas duas fotografias acima, cedidas por Thomas Correa, só se for porque ambos têm dois ponteiros. Não há semelhança alguma. Outra lenda urbana que se populariza e é uma mentira deslavada. Só para quem não sabe, o relógio do Big Ben é obviamente o da esquerda.

Também são lendas urbanas os relatos que afirmam que a estação da Luz é uma cópia da estação ferroviária de Sydney, na Austrália, e que a estação da antiga Paulista em Dois Córregos é uma cópia da estação ferroviária de Marselha, na França. Não são.

É um absurdo que as cidades adotem mentiras como sendo verdadeiras somente para dar alguma fama ao local. Historicamente são mentiras, e das grandes. E por que precisariam dizer que são cópias para chamar a atenção? A estação da Luz e a de Dois Córregos são bonitas por si só, tendo sido construídas respectivamente em 1902 e 1912.

Curiosamente, as três estações brasileiras mencionadas acima foram destruídas por incêndios. No caso de Paranapiacaba, a antiga, em 1981 (e demolida de vez, já que não estava tendo serventia), Dois Córregos em 2001 e a Luz, em 1946. Somente esta última foi restaurada. Será a “maldição da mentira”?

Há outros casos do mesmo tipo de outras estações por aí, dos quais não me lembro agora. Isto leva também a outro problema: as comparações de cidades brasileiras com países, estados ou cidades européias e americanas. Exemplos? Campos do Jordão é a “Suíça Brasileira”. Recife, a Veneza Brasileira. Ribeirão Preto já foi a Califórnia Brasileira. Parece que somos colônias européias, como no passado. Como no caso das estações, há outros casos. Para que nomear cidades dessa forma? Somente se construíssemos cidades exatamente iguais a outra é que poderíamos nomeá-las dessa forma, mas qual seria a utilidade disto?

Já estava na hora de darmos mais valor ao que é nosso. Sem dúvida, a estação da Luz tem um estilo inglês de arquitetura e a de Dois Córregos tem nitidamente influência européia, mas foram construídas aqui, no Brasil. Aliás, é curioso como boa parte das pessoas diz que “tal estação tem estilo inglês”. Tal ferrovia foi construída por ingleses. Tal locomotiva é inglesa. Sempre ingleses. Por quê? Muitas nada têm a ver com a Inglaterra.

Vamos acordar e valorizar o que é brasileiro.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

QUEM É, AFINAL, QUE VOTA NESSES CARAS?

Os políticos brasileiros não têm mesmo vergonha na cara. Acho incrível o apego que eles têm ao poder.

Hoje saiu a notícia de que treze vereadores da cidade de São Paulo tiveram os mandatos cassados por acusações referentes à campanha política antes das eleições. Quer dizer, foram, mas não foram cassados: vão recorrer da decisão a instâncias superiores continuando a exercer o mandato.

Se tivessem vergonha na cara, teriam renunciado agora mesmo. Ou, no mínimo, deveriam ter pedido licença enquanto o processo é julgado em outra instância, e assim permanecer até uma decisão final.

Principalmente aqui no Brasil, onde decisões judiciais duram anos. Se durassem duas semanas, não faria tanta diferença assim ficarem nos cargos — mesmo assim, sob suspeita, deveriam ter o bom caráter de renunciar ou de se licenciar.

Pouco depois, outra notícia: o prefeito e o vice-prefeito do município de Praia Grande também perderam o mandato. A notícia não dizia se eles também iriam recorrer — mas sempre recorrem.

O próprio bigodudo lá do Nordeste, que perdeu o nome de um viaduto em Ribeirão Preto (foi substituído por outra homenageada), aquele que diz que representa o Amapá, mas é dono do Maranhão e cujo nome me recuso a escrever, deveria ter no mínimo se licenciado quando das primeiras acusações. Aliás, não somente do cargo que ocupa na mesa do Senado, mas também do seu mandato de senador.

Mas, não. Como todos os outros, apegam-se vergonhosamente aos cargos mesmo tendo sobre si a suspeita de ter cometido delitos, muitas vezes bem graves.

Este ano — e creio que nos últimos longos anos — somente vi um político renunciar. Foi um deputado do Paraná, cujo nome não me recordo agora, que foi acusado de dirigir bêbado e atropelar e matar uma pessoa. Apesar da séria acusação, foi o único que agiu como um político deveria sempre fazer.

Deputados e senadores têm (inexplicavelmente, para mim) imunidade. Não podem sofrer processos enquanto exercem os cargos. Será que é por isso que não renunciam? Será? Vereadores, não. Mesmo assim, não largam o osso. Isso não dá a todos eles uma desconfiança de que sejam mesmo culpados do que se lhes atribui?

Que tristeza. E que não digam que estou comentando política neste blog. Estou, na verdade, falando do caráter dos políticos do Brasil. Uma grande, uma enorme vergonha para todos nós.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

POÇO PRETO

A antiga estação de Poço Preto - foto minha
Na manhã de 21 de junho do ano passado, um sábado, deixei as cidades gêmeas de Porto União e de União da Vitória para retornar de carro para Curitiba. Tinha também a intenção de visitar cidades pelas quais já havia passado próximo, pela estrada que liga as cidades a Mafra e Rio Negro.

A primeira em que resolvi entrar foi Poço Preto. Vi a placa no asfalto, indicando a localidade par a esquerda, sentido rio Iguaçu. Como não me lembro das mais de 4000 estações em meu site, não me lembrava se Poço Preto seria uma das estações sobreviventes ao caos ferroviário dos anos 1980 e depois às inundações de 1983.

Dei de cara com a pequena estação, no final do caminho de terra. Muito simpático o pequeno prédio de madeira, aparentemente não alterado em sua estrutura, datada de 1923. Dentro, com a porta aberta, um balcão de bar e uma mesa de bilhar. Havia pessoas dentro jogando. Entre elas, o dono do local.

Um polonês muito simpático me atendeu e disse que era o dono, ou o inquilino do prédio junto à RFFSA, já não me lembro bem. O fato é que, segundo ele, estava lá há muito tempo já. Mostrou-me a casa, batemos papo furado e somente não seguimos ao rio Iguaçu, que ficava próximo, porque havia muito mato na ocasião e a chuva da noite anterior tinha sido forte.

Do antigo pátio, somente restaram os trilhos da linha principal, o de passagem. Nada quando olhávamos para o sentido de Mafra e nada quando mirávamos o lado de Porto União. Trens são raridade por ali. Muito de vez em quando – uma vez por ano – o trem de capina química da ALL e, com mais sorte, a locomotiva a vapor da ABPF que de vez em quando traz carros de Rio Negrinho para Piratuba e vice-versa.

A vila em volta da estação praticamente inexiste. Pouquíssimas casas, espalhadas e nada próximas umas das outras. A vegetação é rala, só se veem algumas arvores isoladas e uma ou outra araucária ao longe. Ali pertence ao município de Irineópolis, onde a estação, também de madeira e visitada por mim depois de deixar o bairro, chama-se Valões. Esta está meio capenga, no centro da sede do município.

Depois de deixar Poço Preto, visitei Valões, depois entrei em Canoinhas, atravessei a cidade tentando chegar do outro lado, onde está a estação de Marcílio Dias, mas acabei saindo mesmo foi em Três Barras. Com um museu dentro dela, foi devidamente visitada por mim. Basta rodar um pouco e chegamos à ponte que atravessa o rio Negro e desemboca em um bairro afastado do município paranaense de São Mateus.

Não segui por ali, no entanto. Fui mesmo a Rio Negro, onde almocei, e depois fui para Curitiba tranquilamente, sem me preocupar com tempo. A estrada, a BR-116, já havia sido recuperada em boa parte pela concessionária que ganhara a licitação do governo federal recentemente. Dormi em São José dos Pinhais, num hotel próximo ao aeroporto.

Foi a minha última ida ao Sul, aonde não retornei até agora, infelizmente. Realmente, essa região me fascina.

domingo, 18 de outubro de 2009

O TRÓPICO DE CAPRICÓRNIO

Ontem, no meio de uma conversa, surgiu a história que o Trópico de Capricórnio passa aqui, perto de minha casa. Realmente, passa: quando vou a “downtown” Santana de Parnaíba, cruzo com ele – há uma placa que mostra o seu ponto de cruzamento na Estrada da Bela Vista (ligação Alphaville-centro de Parnaíba).

Embora a latitude seja exatamente 23° 26′ 22″, a placa mostra 23° 27′ 00″, o que é um erro – arredondar os segundos para cima. A foto dela está aí em cima – foi tirada do site da Wikipedia, pois eu jamais a fotografei, embora tenha passado por ela dezenas de vezes. Uma vez eu parei para um americano que achou o máximo cruzar o trópico. Eu tirei a fotografia dele com a máquina dele e fiquei sem a foto. E foi dos dois lados – quem volta também vê outra placa no sentido contrário.

Ou seja, eu moro na Zona Temperada e o Centro de Parnaíba está na Zona Tórrida – lembram-se do que aprendemos na escola, anos atrás? Até minha filha se lembrava, ela que nao dá muita, ou nenhuma, atenção a esses detalhes. Eu expliquei para ela que toda vez que ela cruza a linha do trópico nos fins de semana, pois ela costuma ir aos restaurantes da Praça 14 de Novembro com o namorado italiano, imediatamente após cruzá-la a temperatura aumenta, pois ela muda para uma zona mais quente. Ela dá risada e diz que eu só falo besteira – o que, nesse caso, é verdade.

Minha empregada fica ouvindo a conversa e nao entende muito bem, especialmente depois que eu falei para eles e para ela que passar de carro pelo Trópico, tudo bem, mas passar a pé, tem de ser feito com cuidado, pois há muitas pessoas que se machucaram, pois tropeçaram na linha e foram de boca no chão.

Mais risadas, até da minha empregada, esta por não entender direito do que se está falando. Mas, afinal, para que serve essa linha? Ela é paralela aos paralelos, mas não é um paralelo de valor “cheio”, ou seja, está entre os paralelos 23 e 24. Ele e seu equivalente no Hemisfério Norte, o Trópico de Câncer, foram traçados porque sobre eles haverá ao menos um momento, num dia por ano, em que o Sol estará em seu completo zênite, ou seja, estará totalmente "a pino", de modo que as sombras dos objetos ficarão exatamente sob os mesmos. Isso ocorre por volta de meio dia, variando essa hora em função da posição relativa do local dentro do seu fuso horário.

E entre os dois trópicos esse momento existirá pelo menos duas vezes por ano. E ao sul do de Capricórnio e ao norte do de Câncer esse momento jamais existirá. E como são linhas imaginárias, é claro que ninguém tropeçará na linha, nem minha empregada.

Eu, na realidade, não me lembrava dessa história do zênite, e por causa disso, não sabia para que serviam os trópicos. Agora sei, pois fui olhar na Wikipédia, o atual “pai dos burros”. Sempre se diz que o município de São Paulo tem o trópico de Capricórnio atravessado por ele; na verdade, ele atravessa o norte da cidade. Em Parnaíba, o sul. Ele também passa por Sorocaba, Londrina, norte da Argentina. Passa por onze países no total. E a estação de Capricórnio, ao norte do município de Mairinque, tem esse nome porque o trópico passa próximo a ela (embora mais longe do que da minha casa).

sábado, 17 de outubro de 2009

GOVERNOS QUE NÃO CUMPREM PALAVRA

Já deu para meus leitores perceberem que eu leio todos os dias O Estado de S. Paulo. Não que eu o ache uma grande maravilha de jornal, mas também acho que não tem nenhum que seja melhor – ou menos ruim.

De qualquer forma, o que me chamou atenção foi o fato de que a Prefeitura – ou o Estado, desculpem-me, não sei realmente se essa obra é do Estado ou da Prefeitura de São Paulo – resolveu fechar uma pista de cinco das pontes que cruzam o rio Tietê por causa das obras de construção de novas pistas nas Marginais, uma de cada lado do rio.

Uma das pessoas que não concordam com isso diz na reportagem — depois de afirmar que não acha que a obra vá resolver o problema dos congestionamentos por muito tempo, o que também acho — que o fechamento das pontes será desastroso para os que as cruzam todos os dias (também concordo) e ainda acrescenta que, se as obras ali somente serão feitas à noite, para quê fechá-las o dia inteiro? Note-se que o fechamento será por vários meses.

Finalmente, a pergunta que ele faz que é mais significativa: “Alguém do Governo perguntou para os usuários se pode fazer esse fechamento?” E eu respondo: claro que não. Se o fizer, a resposta será não — o que travaria a obra para sempre, pois o congestionamento sobre e debaixo das pontes é praticamente eterno. E sendo não, acaba aparentemente sendo um contra-senso, pois sem o fechamento as obras que supostamente (para muitos dos usuários) serão um bem para a cidade (eu acho duvidoso) não poderão ser feitas.

Por isso o Governo não pergunta mesmo. Ele sabe a resposta. Afinal, quem não se lembra quando cerca de dez anos atrás o Governador Mário Covas perguntou aos paulistas se aceitavam a proposta dele de cobrar 2 reais a mais em cada conta de eletricidade para que o valor fosse encaminhado para melhorar o nível da TV Cultura, que é do Estado? A resposta foi não! Pode ter sido não porque a maioria não queria gastar mais dois reais por mês (o que é uma miséria), mas sim porque a maioria não confia no Governo! Eles — os governantes — costumam dizer que vão fazer tal coisa, que vão arrecadar para fazer, e simplesmente não o fazem. Ou seja, a TV Cultura continuaria ruim e os dois reais desapareceriam de nossos bolsos para nada.

Afinal, não foi assim, afinal, anos antes, com a CPMF? Aquela porcentagem das movimentações financeiras que era para melhorar a saúde, e que o próprio Governo Federal disse mais tarde que desviou a verba? A saúde pública melhorou? Nem um pouco!

O fato é que a maioria das pessoas não confia mesmo em Governo algum. Culpa dos próprios Governos, de hoje e de ontem. A piadinha acima mostra bem como eles agem...

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

GRADES NA LAPA DE BAIXO

A CPTM, em São Paulo, anunciou há poucos meses que iria colocar grades em determinados pontos da linha, substituindo muros feios e constantemente pichados pó vândalos. Isto não ocorreria em toda a linha, mas nas partes em áreas urbanas e com muito movimento, por exemplo. No entanto, na Lapa de Baixo, parte do bairro da Lapa que fica entre a Marginal do Tietê e as linhas das antigas E. F. Santos-Jundiaí e E. F. Sorocabana, levou a CPTM a decidir pela remoção da cerca recém-colocada. Transcrevo a notícia, publicada hoje n’O Estado de S. Paulo (trecho em itálico e entre aspas, abaixo):

A CPTM cancelou ontem à noite a troca do muro que cerca a Estação Lapa, na zona oeste da capital, por grades. A obra, iniciada neste mês, estava sendo contestada por moradores da Rua William Speers. Eles alegavam que a mudança aumentaria a poluição sonora, reduziria a segurança na via e permitiria que ratos que circulam nos trilhos invadissem imóveis.

A instalação de grades faz parte de um projeto iniciado pela companhia em agosto. O objetivo é construir ou substituir 180 km de muros ou cercas. Desse total, 70 km receberão alambrados, por estarem perto de vegetação. Outros 40 km terão grades. O restante abrange a reforma de muros e a construção deles onde a linha férrea está desprotegida.

O recuo da CPTM foi anunciado um dia antes de os moradores da Rua William Speers entregarem um abaixo-assinado com 500 nomes à companhia. Uma das idealizadoras do protesto, Maria Cristina Santos Terra Rocha, moradora da rua há 42 anos, argumentava que a medida resultaria numa série de transtornos. "Os muros abafam o barulho dos trens, principalmente à noite", acrescentou ela.

Mas alguns moradores foram a favor da substituição. "Adorei isso", disse a dona de casa Alzira Marcelina Jesus. "À noite, assaltantes pulavam o muro. Com grade, a gente conseguia vê-los. Moradora da rua há 60 anos, Maria Cecilia também aprovou a troca. ‘Gostei foi do visual à noite. Até as crianças achavam bonito’.

A CPTM disse que vai remover as grades que já haviam sido colocadas. O local voltará a ser murado
”.

Achei, particularmente, um absurdo tudo isso. Ratos da linha? Faça-me o favor, ratos existem pela cidade inteira, ainda mais num local não muito limpo como é a William Speers. Barulho? Ora, e os carros, caminhões e ônibus que por lá passam 24 horas por dia não fazem barulho? Melhor murar as calçadas, também, nesse caso. Segurança? Trem descarrilado derrubar a cerca? Desculpa para boi dormir. Um avião pode cair sobre as casas, também, da mesma forma que um ônibus ou caminhão podem, desgovernados, destruí-las.

Basta ver a foto acima (também publicada hoje no mesmo jornal) para notar que uma grade é muito melhor do que um muro. À noite, então, nem se fala. Trem de passageiros passando iluminado é muito bonito. Na Marginal do Pinheiros não me canso de vê-los à noite. Certas estão Maria Cecília e Alzira Jesus, que não se dobraram à neurose coletiva.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

CRIATIVIDADE

Novamente me reportando ao site São Paulo Abandonada, do Douglas Nascimento, vi ali a fotografia da área antes ocupada pela fábrica da Caio na Penha. Foi demolida já há cerca de um ano. Não conheço o local, mas é ali na rua Guaiauna.

Da demolição sobrou o portal de entrada. Bonito, com as letras CAIO sobre ele. Já que ninguém quis manter o prédio para dar-lhe outro uso, não custava nada manter o portal, bastante interessante.

Afinal, em que ele atrapalharia? Certamente não enfeiaria o novo local – seja lá o que for – e deixaria a lembrança, a história registrada. Afinal, em várias cidades isso existe. Já vi em Curitiba, Campinas e até em São Paulo esse tipo de coisa, ou seja, uma fachada ou um portal na frente ou em volta de uma nova construção.

Em Curitiba, inclusive, há um estacionamento que manteve o portal de entrada de uma velha fábrica ou depósito, não sei ao certo, inclusive com a forma que ele tomou após um início de demolição contido. É muito simpático.

Quando estive em Alegre, no Espírito Santo, as pessoas que me mostraram a pequena cidade também me apontaram para uma área que havia sido demolida cerca de um mês antes de minha visita e lamentavam o fato. “Era uma das casas mais bonitas da cidade que ainda restava, o sujeito comprou e imediatamente demoliu, dizendo que vai fazer ali outra coisa”. Eu respondi com uma pergunta, logo depois que a pessoa me mostroiu uma fotografia da bonita fachada que ali existia: “ué, por que o dono não manteve somente a fachada e construiu o que queria logo atrás dela”? A minha resposta a isso foi uma cara de “puxa, não havia pensado nisso”! O mal, no entanto, já estava feito. E pouca gente pensa nisso, realmente. Uma pena.

Podemos sempre ter criatividade no caso de termos de demolir uma velha e historicamente significativa construção. Não apenas usar a frase do tipo “ponham tudo abaixo” e dane-se essa velharia”. Em 1986, a fábrica da Matarazzo na avenida Francisco Matarazzo foi para o chão, mas não sem que antes fosse feito um acordo de se manter duas pequenos edifícios e uma chaminé. Já foi alguma coisa, não podemos ter tudo. Isto está lá até hoje, e os prédios já começam a encher o local (infelizmente).

Shopping centers são construídos em prédios de velhas fábricas ou de quartéis, como em Curitiba. Em Porto Alegre e no Rio de Janeiro eles também existem. Aqui em São Paulo, por seu lado, não me lembro de nenhum que tenha sido feito disso, apenas me vem à cabeça o supermercado Extra que foi construído em parte do velho prédio do Cotonifício Crespi, que estava abandonado desde os anos 1960 na velha rua dos Trilhos, na Mooca.

Quem sabe se alguém não convence o novo dono da área da antiga Caio e ele deixe o portal ali como testemunho de outros tempos?

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

QUEM É O VERDADEIRO CULPADO?

Nilópolis, 8/10/2009 - Foto OESP

Hoje saem notícias nos jornais e sites que resultam do tumulto na estação de Nilópolis e o trem queimado na de Mesquita, nas linhas da Supervia no Rio de Janeiro. Uma delas afirma que o Ministério Público vai pedir o pagamento de indenização à Supervia para os passageiros que foram prejudicados com o atraso devido às falhas nos trens naquele dia. Outra que a Supervia tem 48 horas para sanar todos os defeitos que impedem os trens de rodar de forma a não pararem e prejudicarem os usuários.

Não conheço a Supervia, jamais andei num trem deles. Sei que eles recentemente trouxeram alguns TUEs coreanos novos e que só os colocaram para rodar em algumas das linhas. Sei também que há queixas por causa das estações (como a de São Cristóvão, que é muito pequena para o movimento de baldeação) mal cuidadas (não sei se seriam todas). Houve problemas há alguns meses, quando seguranças da empresa bateram em passageiros e que logo depois do incidente em Nilópolis houve outro problema de falha em Japeri que quase causou mais tumultos.

Ou seja – sei o que leio nos jornais. Sem dúvida, a Supervia não é um exemplo de gestão de trens metropolitanos, mas o serviço está muito melhor do que estava quando a CBTU o jogou nas mãos da concessionária em 1997. O número de passageiros, que vinha então diminuindo, voltou a aumentar.

Porém, será a Supervia a única culpada pelo tumulto? E os bagunceiros? Não respondem pela depredação? Ser prejudicado não justifica depredar propriedade alheia. Agora todos vão ser tratados como se fossem sem-terras derrubando laranjais numa fazenda, ou seja, nada vai acontecer?

Está certo que se imponham medidas para a Supervia consertar seus problemas, mas também deveriam ser presos muitos desses bagunceiros. A Supervia diz que foi sabotagem. E se foi? Não estou defendendo a empresa, mas nessas ocasiões tudo pode acontecer. De qualquer forma, há que se melhorar. A Supervia deve pôr as barbas de molho. Todo o mundo falava em privatização do transporte público, mas aqui em São Paulo ele não aconteceu e o serviço melhorou assim mesmo – e muito, nos últimos dez anos.

Enquanto isso, aqui em São Paulo, os funcionários da CPTM afirmam que, para obter melhores salários, vão entrar em greve. Quando? Exatamente no dia em que começam os treinos da F-1 em Interlagos, que tem uma estação junto ao autódromo. Isso se chama chantagem. Se deixarem isso acontecer sem providências, esperem só até ver durante a Copa e as Olimpíadas o que os sindicatos farão.

É como eu sempre digo – não está contente com o salário? Peça demissão, mas não encha o saco de quem nada tem a ver com isso.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

A PENHA E O GOUVEIA

Está quase pronto “O Monstro da Penha”. Os jornais da última semana mostraram fotos de um edifício (os meus leitores já sabem que odeio edifícios) de sei lá quantos andares, mas alto o suficiente para cobrir a vista de parte da Basílica da Penha, exatamente a sua fachada, geralmente a parte mais bonita de qualquer construção, principalmente religiosa. E mais: a igreja da Penha foi construída num dos pontos mais altos do bairro exatamente para ser vista de longe. Agora, pelo menos de um lado, não vai mais ser vista.

Eu já sabia dele: o Douglas Nascimento, que faz o site “São Paulo Abandonada”, já havia me alertado sobre ele, mandando-me por e-mail uma foto que ele tirou. Dias depois saiu no jornal. Mais precisamente, li a reportagem no Jornal da Tarde do último sábado. Parece que as opiniões estão divididas no bairro. Alguns acham ótimo, outros detestaram.

Eu estou com os últimos. Não moro na Penha, fui poucas vezes em minha vida lá mas conheço o bairro razoavelmente para me decepcionar com o mau gosto desse construtor (e, claro, atração pelo dinheiro, que certamente receberá em boa quantidade). Também preciso de dinheiro, mas teria eu a cara-de-pau de construir um prédio exatamente naquele lugar? Há tantos lugares para isso!

Opiniões de gente que gostou, pois “o prédio trouxe mais progresso para o bairro” realmente me assusta. É essa a noção de “progresso”? Prédios em profusão (e nos lugares errados)? E não é a primeira vez que ouço essa deturpação de o que é progresso. Meu comentário para o Douglas foi exatamente esse: “Eu não entendo por que as pessoas querem 'tanto o progresso' das suas cidades ou bairros. Progresso é encher de prédios os lugares antes ocupados por casinhas? Derrubar árvores e extinguir vegetação por causa disso? Tapar o sol e as belas vistas? Impermeabilizar o solo? Derrubar coisas antigas? Isto é progresso? Mas que estupidez. Nós merecemos, realmente.” Ao que ele respondeu: “Confundem progresso com prédios, confundem desenvolvimento com descaso. É fruto da péssima educação que recebemos no ensino público atualmente, aliado com campanha de desinformação da população.”

Depois da minha frase acima, coloquei outra, logo em seguida: “Aqui em Alphaville (no caso, em Barueri) uma construtora anuncia um prédio ao lado do córrego do Gouveia (esse nome acho que somente eu sei) e taparam o vale do córrego, todo arborizado, com uma cerca de tabuas, anunciando que o prédio terá um parque exclusivo. Que m----! O que era um lugar bonito podendo ser visto da avenida agora não poderá mais? Ora, que pelo menos obriguem os caras a cercarem com grades de forma a que não se perca a vista. Mas duvido. Provavelmente construirão um muro mesmo e a vista em vez do belo vale será um muro horrendo que viverá pichado.”

Devo esclarecer que provavelmente ninguém por aqui sabe onde fica esse córrego, pois ninguém sabe mais esses nomes. Tentarei explicar: ele cruza a avenida Andrômeda, bem próximo já à Via Parque, um pouco antes do viaduto que ali existe, sentido rio Tietê. É um dos poucos lugares ainda virgens de Alphaville. Eu não faço questão que o local seja público (mas que deveria ser, deveria!), mas pelo menos quero ter o direito de admirar o local como sempre tenho feito nos últimos anos, pois passo ali quase todos os dias.

Ah, mas que louco sou eu? Ora, sou só um sujeito que acha que progresso não é construir edifícios de dez, vinte ou trinta andares, mas entre outras coisas aprender a conservar o que já existe de belo.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

O REI DE SÃO PAULO SE ACALMA

Amador Bueno, tio de Anhanguera, aclamado em 1641 “Rei de São Paulo”, pode deixar de se sacudir em seu túmulo. A estação que leva o seu nome e que já se chamou Fernão Dias ainda segue na ativa. Lembro-me que no sábado, quando eu e o Thomas usamos o trem, perguntamos ao maquinista o que ele sabia sobre ser aquela a última viagem. Ele respondeu: “ouvi dizer sim, mas nada foi confirmado”.

Ao contrário do que todos esperavam num anúncio que não se sabe bem de onde apareceu, o trem continua andando. Até quando, não se sabe. Porém, com tantas ameaças de parar a linha que vêm desde uns três anos atrás pelo menos, não é de se surpreender se parar de repente.

Os Toshibas andam na Sorocabana (depois Fepasa e CPTM) desde 1957. Eles não serviram somente como trens metropolitanos. Há registros deles funcionando até Botucatu (e além), Itapetininga... Em 1985, a então Fepasa, que mantinha o subúrbio, fez uma reforma geral nos seus já quase trintões TUEs e pô-los para rodar de Mairinque a Itapevi. Até esta última, já havia a bitola mista implantada.

Várias modificações depois, sobrou apenas o trecho Itapevi-Mairinque e a partir de 1998 (nunca entendi este corte!) somente Itapevi-Amador Bueno. Vale também ressaltar que a linha dupla, mas com bitola métrica, começa em Itapevi (São Paulo-Itapevi é bitola mista) e acaba logo depois da estação de Mairinque, na alça de Pantojo, onde volta a ser bitola mista – para seguir somente em métrica depois de Alumínio até o rio Paraná.

A baldeação em Itapevi, portanto, vem de 1985. E o trecho, como os outros, era pago. Porém, com seguidos assaltos a bilheterias em um lugar de segurança perigosa, a um determinado momento – já há mais de dez anos – a cobrança desapareceu. Abriram-se as estações e quem faz o trecho baldeando em São Paulo ou embarcando e desembarcando numa das quatro estações do Toshiba nada paga. Paga quem entra ou desce em Itapevi, pois é obrigado a passar pela roleta quando entra.

Enfim – a notícia é boa, pois o trem segue rodando. Porém, segue rodando com suas duas pinturas (Pomarola, vermelho recente pintado sobre uma carcaça cheia de amassados e a “pichação orientada”, um horror) e vidros riscados, além de portas que eventualmente não fecham. É uma má propaganda para a CPTM.

Se as notícias que ele vai parar por algum tempo para a colocação de bitola mista são reais, a notícia é boa – desde que não desistam de fazer as obras depois de pararem com o trem. Enfim, há alguns sinais de início de obras: elas existem neste instante nas plataformas de Itapevi, nos muros que se começa a construir para isolar a linha em Santa Rita, nos dormentes novos que se veem ao lado da linha em alguns trechos. Porém, há cortes e aterros na linha atual que vão necessitar de uma parada no trem para ser alargados. A rebitolagem total não vai ser possível sem a parada dos TUEs.

Ao final, os TUEs franceses que hoje correm de São Paulo-Itapevi poderiam seguir diretamente até Amador Bueno. Esperemos não só que isto ocorra, como também que se substituam os já velhos e anacrônicos franceses por TUEs novos que já existem nas outras linhas. E, finalmente: com o prédio da estação de Amador Bueno antiga (que sabe Deus por que foi fechado em 1985) tão próximo à plataforma com cobertura atual, por que não reformar o mesmo e colocá-lo como bilheteria novamente? Isto impediria sua degradação, que está sendo rápida, mesmo com o guarda que fica lá dentro cercado por grades nas janelas com vidros quebrados — parece que o prisioneiro é ele.

domingo, 11 de outubro de 2009

2o BATALHÃO FERROVIÁRIO

Recebo diariamente e-mails, eventualmente cartas pelo correio, de colaboradores e de gente que viu o site e gostou. Estes últimos também são muito importantes, pois mexem com nosso orgulho. Parece que consegui fazer um trabalho que realmente pode ajudar outras pessoas em vários sentidos.

Este foi recebido há alguns dias.

Após vários dias procurando fotos dos trechos da Ferrovia do Tronco Principal Sul, onde servi entre os anos de 59/62, no 2º Batalhão Ferroviário, Batalhão Mauá, na 3ª Cia de Construção, Taiti, Túnel 18 e São Felipe (fim do trecho), Km 234, só encontrei abandono e desolação. Eu era 3° Sargento na época, e trabalhávamos dia e noite construindo uma estrada nos moldes europeus. Eu me sentia orgulhoso por realizar um serviço deveras relevante ao nosso País.

Hoje, ao ver o abandono em que as Ferrovias se encontram, sinto uma tristeza profunda, por ver os desmazelos de nossos "administradores".

Senti uma pequena alegria, hoje, ao ver uma foto de 1959, do então Coronel Comandante do batalhão inaugurando o monumento de chegada dos trilhos em São Felipe, no fim de nosso trecho. Não estou na foto, mas eu estava lá.

Homens como você, ajudam a fazer e a dar um pouco de vida à nossa história tão maltratada.

Nos últimos dias, eu ia dormir com a imagem da destruição das estações e demais prédios construídos com tanto esmero. Hoje, porém, sinto-me melhor por estar interagindo com você e o Edmar César, que também encontrei na mesma página.
Que Deus abençoe ao senhor e sua família. Continue com esse trabalho.
Sou Cap R/1 do Exército, estou na reserva há 21 anos e moro em Porto Alegre.

Osvino Jacob Gonçalves

Nota: Edmar César, citado por Osvino, é um historiador que trabalha hoje no mesmo Batalhão, que fica em Araguari, MG, tendo este Batalhão sido transferido de Rio Negro, PR, onde ficou até 1965, quando as obras da ferrovia do Tronco Sul (trecho Mafra-Lajes) terminaram.

sábado, 10 de outubro de 2009

AMADOR BUENO NUNCA MAIS?

O "Pomarola" em Amador Bueno, fotografado após nosso desembarque hoje

Há alguns dias chegou um anúncio extra-oficial de que hoje seria o último dia de viagem do trem da CPTM que faz com os velhos Toshibas da Sorocabana o trecho Itapevi-Amador Bueno (eletrificado, bitola métrica). Como eu jamais havia tomado esse “trem de luxo”, resolvi aproveitar o sábado para nele andar, confirmando-se a notícia ou não. Perguntamos ao maquinista: ele diz que nada foi confirmado nesse sentido.

Na visita e viagem acompanharam-me dois outros fanáticos que vieram desde Santo André fazendo baldeação na Luz e me esperando na estação de Itapevi às 10:30. Como moro relativamente próximo à linha, fui-me encontrar direto com eles lá, deixando meu carro num estacionamento no centro de Itapevi.

Chegamos e tomamos o primeiro trem, que sairia uns cinco minutos depois que eu cheguei. Era um com a pintura vermelha, apelidado de Pomarola. Foram 20 minutos de viagem até a estação de Amador Bueno, na única linha da CPTM que ainda resta em bitola métrica.

O trem parte e no início do percurso, até chegar a Santa Rita, a paisagem ainda pode ser chamada basicamente de urbana. A estação consta de plataformas sem coberturas, todas pichadas. Como não há bilheterias (pode-se embarcar nas quatro estações do trecho sem pagar), também a estação não é cercada.

Após deixar Santa Rita, uma das portas não se fecha (ela estava fechada durante a viagem até a primeira estação). Passamos a acompanhar a viagem dali, em pé em frente à porta, pois os vidros das janelas estavam riscados demais. O percurso entre Santa Rita e Cimenrita é mais curto que os outros. Em Cimenrita, outra estação sem cobertura nas plataformas, pode-se “admirar” os restos mortais da antiga fábrica de cimento Santa Rita, por muito tempo a segunda maior fábrica do Brasil e desativada há anos. Foi finalmente implodida há poucos meses.

Dá para ver do lado direito da linha o rio São João, praticamente um córrego, corcoveando ao lado da linha. Estreito, ele começa em São João Novo, estação que já há mais de dez anos o trem da CPTM não alcança, e deságua no rio Cotia, quase junto com o deságue deste no Tietê, depois de passar pelo centro da cidade de Barueri, onde está canalizado.

A paisagem é praticamente toda rural, dos dois lados da linha. Pode-se ver, numa das pouquíssimas casinhas próximas à linha, um lavrador mexendo na terra ao lado das diversas bananeiras ao largo do rio. Bem bucólico, mesmo. Mais um pouco e o trem para na 3ª estação, Ambuitá. O nome desta estação foi formado há anos pela combinação da estação posterior, Amador Bueno, e o da de Itapevi (não existiam ainda as duas estações intermediárias).

O trem com três carros (composição padrão desde os primórdios do Toshiba na Sorocabana, em 1957) está quase vazio. No nosso carro, apenas cinco pessoas, contando conosco. Afinal, é sábado. A meio caminho de Amador Bueno, uma casa ferroviária típica, linda, anos 1930, à beira da linha. Ainda é habitada.

Finalmente o trem chega a Amador Bueno. Todos descem e depois de cinco minutos o trem parte de volta. Ficamos por lá cerca de meia hora, observando sinaleiras abandonadas, um vagão-gaiola e um vagão descarregando placas de MDF (devia ser algum problema com o vagão, pois não há descarregamento desse material ali). Um trem da ALL aguarda ordem para prosseguir no sentido interior.

O trem que chega e nos trará de volta é um todo pichado: na verdade, a pintura dele é a pichação. Arte popular, dizem. Lixo e falta de educação, digo eu. Um passageiro tenta embarcar com a bicicleta; os guardas da estação fazem-no descer com ela. Seguimos para Ambuitá. Fotografo a tal casa ferroviária. Quando chegamos a Ambuitá, o mesmo rapaz com a bicicleta está esperando: ele entra no trem, ali não há guardas. E a conclusão de que viajando de bicicleta se anda mais rápido que com o Toshiba da CPTM.

Paramos em Cimenrita, em Santa Rita e chegamos a Itapevi. Pronto, dever cumprido: agora o trem pode acabar. As notícias são que a bitola será alargada até Amador Bueno e dentro de algum tempo a CPTM fará o percurso Julio Prestes-Amador Bueno direto, sem baldeação. Se isso é verdade, somente o tempo dirá. Espero que sim. De qualquer forma, no trecho dá para ver que colocar duas linhas de bitola larga não vai ser tão simples, há obras pesadas para se fazer. Vimos dormentes novos ao longo de alguns trechos da linha e colocação de muros na região de Santa Rita, além de as plataformas da estação de Itapevi estarem em obras. Sinal de que a reforma já começou? Vamos aguardar... Terá sido hoje o último dia do trem, realmente?

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

UMA TARDE EM UM CIRETRAN DA VIDA

Esta tarde fui a um Ciretran de uma cidade que não é São Paulo. Uma graça. Um funcionário para atender o público, o telefone e o chefe. Uma fila enorme numa cidade pequena. Há senhas, mas um monte de gente, dizendo que “é só uma perguntinha” ou “é só para entregar esta cópia xerox” fura a ordem das senhas. E a funcionária, em vez de manter a ordem, atende assim mesmo.

O mais engraçado foi o último caso, o do velhinho que se vira para o público que espera e diz “é só para entregar esta cópia xérox” e avança. A funcionária atende. E é aí que todos descobrem que ele é um caipirão, ignorante, ingênuo e... surdo. A cópia do documento que ele foi entregar não servia.

Não servia porque dizia que o carro era gasolina e gnv, e o senhor disse que “tirou o gnv”. E ainda por cima, que o carro era de inventário. Aí a funcionária disse que precisava mudar a documentação para dizer que era só gasolina. Mas como era de inventário, precisava de um advogado. E que o carro não podia rodar, senão a polícia iria apreender, levar para o pátio onde ele ficaria exposto ao sol e à chuva e ficaria enferrujando, pois quem poderia retirá-lo de lá já morreu.

O velhinho surdo não entendeu nada e voltou a fazer a mesma pergunta. Ela explicou de novo. Ele disse então que iria pôr o aparelho de gnv de novo, pois ele o tinha guardado. Ela disse que está bem, ele poderia pôr, mas mesmo assim não poderia rodar com o carro, pois teria de “desenrolar” o inventário.

O velhinho não entendia. Aí apareceu um outro senhor, muito simpático, que explicou tudo de novo e mais devagar para o velhinho, que não entendia nada enquanto não saía do balcão e a funcionária quando não estava tentando dizer para ele ir a um advogado, estava atendendo telefonemas e dizendo que ela não podia passar informações por telefone porque o local estava lotado de gente e ela não dava conta.

Quando ele finalmente se convenceu de ir embora, a funcionária pediu para ele esperar que viria uma terceira pessoa para falar com ele. Ele não entendeu. Ela repetiu: “o senhor aguarde aí sentado, que a fulana vem falar com o senhor”. Parece que desta vez a coisa foi.

Aí eu fui atendido. Foram 2 minutos só – mas no meio da conversa, o telefone tocou e ela atendeu e perdeu mais um minuto.

Burrocracia (com rr, sim) e desorganização bem típica de CIRETRANs, DETRANs etc. E tanto faz a cidade: parece que nunca vai acabar.

E o velhinho surdo vai ficar a pé por muito tempo.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

AS CHAMAS DO DRAGÃO

Só prédios junto ao rio Pinheiros... os barquinhos com "pessoas" são na verdade de plástico, em protesto contra a poluição do rio
Provavelmente já descarreguei aqui neste blog a minha ira contra o crescimento absurdo da cidade de São Paulo. Hoje cedo, porém, ouvindo rádio, um comentário me fez outra vez pensar na insanidade que é a manutenção do crescimento da cidade.

Dois “ouvintes repórteres” de uma rádio comentavam que a via Anhanguera e a via dos Bandeirantes, que chegam ambas de Campinas e além, descarregando seus automóveis, ônibus e caminhões na Marginal do Tietê, estavam “totalmente paradas” desde cerca de 5 quilômetros antes da junção com a Marginal.

Ora, a Anhanguera teve há poucos meses aberta a nova ponte que cruza o rio no seu encontro com a cidade. A Bandeirantes já há anos tem uma saída decente e direta nas duas postas da Marginal, uma de cada lado do rio. Os congestionamentos existem também há anos. Ou seja, construir as novas pontes na Anhanguera não adiantou nada. Claro que não. O problema não é ela – é a Marginal que não comporta o transito.

Enquanto isso, a Castelo Branco está tendo uma nova saída construída na junção com a Marginal do Tietê, sentido Penha. Também não vai adiantar. O problema não é ela – é a Marginal que não comporta o trânsito (sim, repeti a frase do parágrafo anterior).

A Marginal do Tietê, por sua vez, está em obras para aumentar suas pistas. Vai adiantar? No meu parecer de leigo, pouco. A solução para tudo isto é: pare de crescer, São Paulo. Pare de construir enormes prédios de apartamentos e escritórios. Deixe para reformar os galpões, casas e prédios de apartamento e escritórios antigos que já existem, muitos deles vazios.

Os erros vêm de longe: inúmeros prédios de apartamentos e de escritórios construídos sem vagas para automóveis ou com vagas insuficientes. Os carros então param nas ruas ou em estacionamentos particulares de preços verdadeiramente absurdos e aumentando sempre. E mais: os prédios novos têm realmente vagas para todo mundo. Mas são enormes e descarregam carros nos horários de pico como chamas saindo das ventas de um dragão medieval. Não há espaço para eles, e os congestionamentos se formam.

Leis de zoneamento e planos diretores para a cidade são feitos desde os anos 1970. De nada ou pouco adiantam, pois uma lei de zoneamento e um plano diretor são feitos para serem eternos, com modificações pontuais se realmente e muito necessárias. Entretanto, em São Paulo, cada vez que se completa a capacidade (que não é pequena) de construções de edifícios em um bairro, a solução é... mudar o plano diretor e aumentar o número permitido. Não dá. Não podemos continuar aceitando passivamente curvar-nos ante uma minoria prejudicando uma imensa maioria.

Temos de acordar antes que o caos... não, esse já veio. Melhor: antes que o apocalipse paulistano venha.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

A VELHA NOROESTE

Interior de um carro de luxo da Noroeste nos anos 1940 e 1950
Ontem me lembraram da Noroeste. Foi o dia de minha palestra – a quarta sobre o assunto – sobre ferrovias no curso do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, na rua Benjamin Constant.

A palestra sempre vai além do horário, por causa da agradável conversa que se toma após a apresentação. O tema sempre gira em torno dos trens de passageiros “e a saudade que eles deixaram”, como diz parte do longo título de meu livro publicado em 2001.

Uma senhora que a assistiu começou a se lembrar das viagens que fez pela Noroeste do Brasil. Com mais de oitenta anos, disse que a última viagem foi sessenta anos atrás. Ao pé da letra, em 1949. E deve ter sido mesmo, porque pelo seu relato o trem partia ainda de Porto Esperança e não de Corumbá. Realmente, ele chegou a Corumbá somente em 1952.

Eram, segundo ela, oito dias de viagem. Oito dias? Mas como? Ora, ela morava em Cuiabá, onde nasceu “num casarão urbano que existe até hoje, de 1840”. De Cuiabá a Porto Esperança eram seis dias de viagem pelos vapores que desciam o rio Paraguai. Mais dois dias até São Paulo, pela Noroeste, baldeando em Bauru para a Paulista e trocando de locomotiva (elétrica para vapor ou diesel) em Jundiaí, onde tomava o comando a Santos-Jundiaí.

Foram várias viagens, segundo ela. Ela adorava. Ela se lembra da “majestosa ponte de ferro sobre o rio Paraná”, da baldeação em Bauru e dos trens da Noroeste, muito bonitos e confortáveis, segundo ela... os únicos senões eram o calor e a poeira, sempre presentes. O trem saía com poltronas limpas de Bauru e chegava com poltronas escurecidas a Porto Esperança.

E Porto Esperança? No meio de lugar nenhum, às margens do rio Paraguai, pequeno e pobre, era nessa época igual ao que é hoje. Ela se recorda da alegria de ver as luzes do vilarejo, ao longe, do barco que chegava depois de seis dias de viagem. Ali pegariam o trem que sempre estava à espera dos vapores.

A partir de 1949, ela passou a vir de avião de linha. Uma viagem que se fazia em oito dias passou a ser feita em oito horas, segundo ela. E que hoje se faz em duas. Mas ela diz que nem as duas horas do avião que ela ainda toma para ir de quando em vez a Cuiabá matam o conforto do trem – até dos vapores ela se lembra com alegria, onde quase sempre passageiros cantavam e faziam serestas para passar o tempo.

E não pensem que a senhora, que tinha um nome longo – dois prenomes e quatro sobrenomes – era gente sem posses. Fazia, e ainda faz, parte da famosa “elite”, tanto citada pelo nosso Presidente que diz que esse pessoal não interessa, interessam os pobres (sem comentários).

A simplicidade fazia parte dessa época. Claro, no entanto, que substituir uma viagem de oito dias por uma de oito horas valia a pena, cansava muito menos, mas não era a mesma coisa. Como ela diz, era outra época, eram outras pessoas.

A Noroeste hoje sobrevive no nome da ferrovia, que continua sendo pronunciado, embora oficialmente não exista mais, no clube de futebol, no banco recentemente extinto e que tinha esse nome, na zona das cidades que a ferrovia percorria e que mantêm o velho nome.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

O ÚLTIMO FIM DO BARRINHA

O velho Barrinha ainda em funcionamento. Foto J. H. Buzelin

Último remanescente dos trens de longo percurso que utilizavam a Linha do Centro da extinta Central do Brasil, o trem Barrinha, que ligava as estações de Japeri e de Barra do Piraí, no Rio de Janeiro, deixou de circular depois de um grave acidente ocorrido em 1996 que causou a morte de 15 pessoas e deixou 60 feridos.

Ele supria a necessidade de transporte das pequenas cidades e bairros da Serra do Mar e se estendia até Barra do Piraí, depois de passar por estações com as de Paulo de Frontin, Palmeira da Serra, Mendes e Santana da Barra, além de outras menores.

Como era muito conveniente para a privatização das linhas da RFFSA, que ocorreram nessa época, a sua extinção para não “atrapalhar” a circulação dos trens da concessionária que ganhou a concorrência – a MRS – por algum tempo não se falou mais em operar a linha.

Porém, logo depois se voltou a discutir a volta do trem e uma composição foi totalmente reformada no início dos anos 2000 para que voltasse a operar. Sua volta, entretanto, foi constantemente protelada até que hoje se anunciou que ele definitivamente não voltará. Segundo o site do jornal O Dia, o jornalista Ricardo Villa Verde afirma que sua volta “foi descartada pelo governo do Estado. As composições que haviam sido reformadas para voltar a circular no trecho serão deslocadas para o ramal de Guapimirim, que será operado pela Supervia. Por isso, os trens já estão tendo as bitolas alteradas. A informação foi confirmada pelo secretário estadual de Transportes, Júlio Lopes. ‘A Supervia está mudando a bitola dos trens porque o Barrinha não pôde ser utilizado por causa do transporte de carga da MRS’, explicou o secretário”, afirmando que “não havia como dar previsibilidade de horário para circulação do Barrinha, porque o ramal entre Japeri e Barra do Piraí é extremamente utilizado pela MRS para transporte de cargas”.

O interessante é que as concessões dadas pelo Governo para as linhas brasileiras estabelecem que desde que haja uma concessão para trens de passageiros nas linhas concessionadas para cargas, a concessionária é obrigada a dar licença para a operação desse trem. A volta do Barrinha aos trilhos chegou a ser anunciada para 2007, mas entraves com a MRS Logística impediram seu retorno.

São os interesses privados se sobressaindo sobre o coletivo. E desta situação deduz-se que das duas uma: ou a MRS manda mais que o contrato ou o Governo do Rio está pouco se lixando em fazer o Barrinha rodar. A segunda hipótese é muito mais provável, podem crer.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

GUIA LEVI – UM RETRATO DO PASSADO DOS TRENS DE PASSAGEIROS

Quem é paulistano ou carioca, tem mais de 40 anos e nunca viu um Guia Levi nas mãos? Publicado até 1984, o Guia Levi, pelo menos entre os anos de 1908 e de 1979, era uma publicação mensal que se parecia com um guia de ruas como os de hoje no formato e na grossa lombada (se bem que os guias de hoje são bem mais grossos), mas era originalmente um guia que dava os horários de trens do Brasil inteiro.

Eu tenho alguns, mas nenhum é remanescente dos que eu tive nas mãos num passado distante; foram todos comprados nos últimos treze anos. Os mais antigos que vi foram os de 1908 a 1910, encadernados na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Já eram mensais. E, segundo quem os utilizava, bastante confiáveis, embora em guias mais recentes (anos 1960 e 70), eu tenha encontrado erros crassos – a publicação de horários de uma ou outra linha que já não funcionava mais. No entanto, estes erros não deviam ser por culpa dele e sim da desorganização das ferrovias que já começava a existir nessa época. Elas eram quem forneciam os horários para os Guias Levi.

De 1980 a 1984 os guias passaram a ser anuais, o que menos tinham eram horários de trens. Já não mostravam os horários do Nordeste e do Sul do país; somente de São Paulo, Rio, Minas e Espírito Santo. Está certo que eram poucas linhas que ainda funcionavam, mas elas existiam também nos outros estados. Depois disso acabou.

Ele não se adaptou as novos tempos. Embora desde os anos 1950 ele tivesse mapas de São Paulo (ou do Rio, dependendo de onde era vendido) dividido em páginas, como nos guias atuais, e também horários de ônibus, bondes, indicações de pontos turísticos etc., as diagramações dos guias de 1979 e dos de 1908 não eram tão diferentes. A capa, por exemplo, chegou a ser considerada “cult”, tendo sempre um mosaico de propagandas e uma locomotiva a vapor no canto esquerdo superior. Também vinha sempre com um mapa dobrável que mostrava de um lado todas as ferrovias do País e de outro o mapa da cidade de São Paulo ou Rio.

Não se adaptando às mudanças do tempo, ele começou a perder vendas: os outros guias, anuais, desenvolveram mapas por páginas coloridas e índices de ruas mais fáceis de ser lidos, além de informações mais bonitas à vista do leitor, papel melhor etc. Alguns davam inclusive os horários dos trens de São Paulo.

Hoje, os Guias Levi são peças bastante difíceis de ser encontradas. Apesar de terem sido emitidos muitos diferentes — afinal, foram mensais por 80 anos —, não se os encontram em sebos ou antiquários com a facilidade que seria de se esperar.

domingo, 4 de outubro de 2009

O FIM DE UMA ERA

Trilhos em Rio Claro, no percurso Santa Gertrudes-oficinas - Foto Panoramio

O novo fim de uma era agora se dá em Rio Claro, SP. Com a construção da variante Santa Gertrudes-Itirapina, aberta ao tráfego em 1976, os trens de passageiros e cargueiros da FEPASA passaram a se utilizar da nova linha e das novas estações ali construídas (Rio Claro, Camaquã e Graúna). Logo os passageiros começaram a reclamar do problema que era embarcar e desembarcar na estação nova de Rio Claro, construída num pátio ao lado (mas não tão ao lado assim) da rodovia Rio Claro-Piracicaba, tendo por vista o perigo para a segurança pessoal que isso representava. Aliás, essa estação também era chamada de Guanabara.

A FEPASA passou então a usar novamente a estação velha, no centro da cidade de Rio Claro, unindo a linha velha com a variante através de uma linha construída e que se juntava com a nova próxima ao distrito de Batovi.

Isso ficou até o “fim dos tempos” em Rio Claro, quando a FEPASA passou para a RFFSA e quase que imediatamente para a FERROBAN, que tinha como cláusula de contrato operar as linhas de passageiros que sobraram durante um curto período de tempo.

De janeiro de 1999 até março de 2001, quando o “fim do fim dos tempos” chegou, a FERROBAN pouco se importou com os escassos passageiros e operou apenas na estação de Rio Claro-nova.

De qualquer forma, os trilhos da linha velha foram ficando e acabaram por serem retirados logo depois, pelo menos na parte próxima à estação, e roubados em outros trechos. Quando se passa pela rodovia Washington Luiz por sobre o viaduto que tem a linha velha por baixo, já há vários anos somente se vêem os dormentes, que também foram sumindo aos poucos.

Agora querem tirar o resto – com exceção do trecho Santa Gertrudes-estação de Rio Claro-velha, que, como esta última tem a oficina de vagões ao lado, ainda precisa ser alcançada pelos trens hoje da ALL. O prefeito diz que “os planos da prefeitura para a utilização do trecho sem trilhos incluem a construção de uma longa avenida concebida dentro dos mais modernos critérios técnicos" – seja o que isto signifique. De qualquer forma, é a mesma besteira de sempre: prefeitos adoram avenidas, que por sua vez trazem a deterioração do lugar, que hoje está abandonado, mas não deteriorado. A qualidade do ar piora por causa dos carros (lembrar sempre que 70% da poluição das cidades é causada pelos gases dos automóveis), etc. etc, pois ninguém mais hoje em dia quer morar em avenidas, então as casas chiques que outrora nela se construíam serão substituídas por galpões.

"O fundamental é que a obra vai unir as duas partes da cidade até então separadas pela ferrovia" e "nas últimas décadas, os trilhos dificultaram e muito a integração da cidade e deixaram um vácuo no mapa urbano" – frases também ditas pelo prefeito, hoje em dia totalmente sem sentido. Metrô leve ou VLT, nem pensar, não é, Sr. Prefeito?

Finalmente, um comentário de um amigo meu depois de horas de discussão em listas do assunto sobre a retirada dos trilhos: “Incrível o ódio das cidades para com a ferrovia. Acho que em 30 anos vai ser difícil ter uma oficina ou estação onde o trem ainda passa”. Ele tem razão quanto ao ódio. Depois que as classes mais abastadas abandonaram os trens de passageiros nos anos 1940 e 1950, a ferrovia passou a ser mal vista e as rodovias priorizaram os investimentos no Brasil. Grande engano e um dos causadores de muitos dos problemas pelos que o País passa hoje em dia.