sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

ENSAIO SOBRE AS ESTRADAS DE SANTANA DE PARNAIBA, SP

Trecho da Estrada do Ipanema, a uns 3 km do Alphaville. Foto minha.
Santana de Parnaíba, cidade bem antiga em termos brasileiros, foi fundada em 1580. Elevada a município em 1625, separou-se de São Paulo e teoricamente, para a época, tinha como território todo o resto do Estado como ele é hoje, com exceção apenas da região ao sul do Tietê, do Vale do Ribeira, do litoral e do Vale do Paraíba.

Cidades como Itu, Sorocaba, São Roque, não muito distantes de Parnaíba, ou São José do Rio Preto, Araraquara, Ribeirão Preto e Franca, também exemplos mais longínquos, um dia teoricamente pertenceram à cidade onde hoje eu moro. Em 1625, ao se tornar vila - hoje, município - separando-se de São Paulo, a cidade era o que se chamava de "boca de sertão". Isto fazia qualquer cidade crescer. Foi o caso desta. Porém, como ponto de partida de bandeirantes para o Brasil todo, pessoas que ajudaram o país a ter o tamanho que hoje tem, quando estes descobriram ouro em Goiás, Cuiabá e em Minas Gerais, ajudaram a despovoar a própria cidade.

A descoberta da imagem de uma santa em Pirapora (hoje, do Bom Jesus) também deslocou o centro de atenções de Parnaíba para lá. A partir do final do século XVIII, Parnaíba já era uma cidade sem importância, onde apenas a tradição unia os poucos que restavam e davam ainda alguma força à pequena vila de menos de mil habitantes em relação à já capital São Paulo.

As estradas que levavam ao sertão já não passavam pela pequena vila. O Tietê somente era navegável a partir de Araritaguaba - hoje Porto Feliz. Parnaíba estava isolada. A decadência era enorme no século XIX, mas o orgulho de seus moradores salvava a vila. Na verdade, já no século XX, em 1935, o município deveria ter sido absorvido por São Paulo, devido à sua renda insignificante. A tradição conseguiu evitar o fato a se consumar. Entre 1935 e 1959, a cidade perdeu os atuais municípios de Carapicuiba, Barueri, Cajamar e Pirapora do Bom Jesus, além de uma enorme área para Franco da Rocha e Caieiras.

Apesar de tudo isso, Santana de Parnaíba continuou ali com sua decadência sem fim. Esta decadência somente acabou com a "invasão" forçada de bairros que a cercavam, fazendo a população aumentar a partir de suas divisas para dentro. Dois bairros como a Fazendinha e o Alphaville, a partir do final dos anos 1970, incharam a cidade para dentro.

Mesmo assim, a cidade ainda é um núcleo não tão maior do que era o centro histórico em 1900, com diversos bairros afastados por matas e terrenos vazios. A Fazendinha e o Alphaville usam de estradas para chegar ao centro da cidade, hoje tombado pelo CONDEPHAAT (desde 1982) e com casas que ainda remontam aos séculos XVII, XVIII e XIX, afora várias do início do século XX.

A cidade passou de 3.000 habitantes em 1900 para 20.000 em 1980 e 120.000 hoje. Os espaços intermediários continuam. A área "rural" ainda não está muito longe de ser 50% da área total. Com isso, até há bem pouco tempo nomes de "estradas" ainda eram comuns.

A Estrada Tenente Marques, praticamente a única ligação com a Fazendinha, era a antiga estrada de Perus. A estrada que liga Alphaville com o centro sofreu modificações no traçado, mas basicamente já teve vários nomes: Estrada de Dentro, Estrada Velha de Parnaíba e hoje é a Estrada da Bela Vista. Quem pediu a manutenção desse nome fui eu, em 1997, numa carta a um vereador para passar para o prefeito. Esse era um dos antigos nomes dela e isso fez com que ela retornasse a possuí-lo - mesmo assim, trechos dela mudaram de nome, como, por exemplo, avenida Yojiro Takaoka.

A Estrada de Ipanema mantém o nome em alguns trechos - em parte, é hoje "avenida Valville". A Estrada do Lula Chaves também cedeu um trecho para a avenida Valville. A estrada velha de Itu passa muito longe do centro e mantém o nome no Coruruquara. A estrada "nova" de Itu foi construída em 1922 a partir de Barueri, aí sim, passando pelo centro da cidade e seguindo para Pirapora, Cabreuva, Itu e além - já foi Estrada de Rodagem para o Mato Grosso, depois Marechal Rondon e hoje é Estrada dos Romeiros até Pirapora.

Lembremos que a estrada que ligava Barueri ao centro de Parnaíba até 1922 teve partes dela absorvidas pela atual Romeiros. Um bom trecho dela é a atual rua Campos Salles em Barueri. Mas a partir de um certo ponto, subia para o largo da Cruz Preta não por onde sobe hoje, mas pela atual Sargento José Siqueira, depois pela atual avenida Capitão Francisco Cesar e finalmente saía na atual Romeiros ali perto do atual Parque Santana. Esse trecho final ainda se chama "Estrada Velha de Barueri". Estes trechos faziam parte da antiga "Estrada de Fora".

A Estrada do Jaguari liga esse bairro, perdido atrás do Alphaville e do Valville, à estrada Tenente Marques. Ela acompanha o rio Jaguari. Já pensou mudarem de nome? Para "avenida"? Para o nome de alguem?

Finalmente, a Estrada do Suru, que já foi da Capela Velha e até o meio do século XX  a "Estrada de Araçariguama". Hoje as placas mostram "Estrada Turistica do Suru" (não tem nada de turística). O Suru é um bairro que exista há mais de cem anos, a meio caminho entre o centro e a rodovia Castelo Branco, onde a estrada acaba no km 42.

Os nomes ainda são usados popularmente. Há uma mistura de nomes para a mesma rua. Placas são raras. Mapas dizem cada um uma coisa. A numeração é confusa e dá margem a situações em que, mesmo numa rua curta, você se perde.

Curioso que isto é uma situação tão simples de se resolver, tão barata, mas a Prefeitura - não somente a atual, mas praticamente todas as antecessoras, nunca parecem ter se preocupado. Por que não mantiveram os nomes antigos e tradicionais? Aqui onde moro, atrás da minha casa, passava a "Estrada de Dentro", ainda passa, mas desde 1977, quando passou de picada a avenida larga asfaltada, se chamou avenida Alphaville e depois Yojiro Takaoka. Para que?

Por que não se arrumam as numerações? Por que se mudam nomes de ruas tradicionais? É tão difícil assim? O pior é descobrir que esse tipo de coisa não acontece somente em Parnaíba, mas em praticamente todas as cidades do Brasil.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

PARA OS QUE GOSTAM DE TRENZINHOS DE BRINQUEDOS

Trem turistico em Rio Acima, MG. Outro sustentado pela Prefeitura. Foto de 2009 - Autor Gutierrez L. Coelho

Para os que gostam de trenzinho de brinquedo pagos e mantidos com dinheiro público: as más notícias se acumulam, mas os piores cegos são aqueles que não querem ver.

Trens de Ouro Preto e de São João del Rey, até onde sei, são sustentados pela FCA. Já o Serra Verde atua na Curitiba-Paranaguá e na linha do Litoral no Espírito Santo sendo uma empresa privada. Ótimo.

Enquanto a ABPF - Associação Brasileira de Preservação Ferroviária - se mata com seus voluntários e com a doação de dinheiro dos próprios bolsos de seus associados e de admiradores às vezes anônimos para fazer seus trens andarem em linhas exclusivas (como em Campinas, em Rio do Sul, em São Lourenço e em Passa-Quatro) e portanto terem de pagar pela manutenção caríssima da via permanente (claro, há locais em que a linha não é particular e aí a coisa se complica mais, pois depende de licença, como em Rio Negrinho), em algumas cidades é a prefeitura que resolve colocar trenzinhos de brinquedo para funcionar com dinheiro do povo.

Eu não admito isso. No entanto, quem sou eu para "admitir" esse tipo de coisa? Eu não admito porque as prefeituras têm é de pagar por transporte público para seus munícipes, diários e constantes, como VLTs ou mesmo TUEs - trens-unidade elétricos (este, caso da CPTM).

Santos, São Vicente, Cuiabá , Crato e Juazeiro estão fazendo ou já tem seus VLTs funcionando. Outras cidades têm a ideia, séria ou não (infelizmente, a maioria não é séria: ano de eleições é fogo) de colocar esse transporte sobre trilhos, seja ele qual for. Nos últimos meses e anos, diversas cidades já falaram muito e fizeram pouco, ou nada, como Macaé (esta chegou a comprar os VLTs, que estão encostados), Sobral, Arapiraca, Maceió (estão em testes em pelo menos parte do caminho), Campos dos Goitacazes (anunciou na semana passada que pretende usar a linha da ex-Leopoldina que cruza a cidade e que não está sendo utilizada pela FCA, que tem sua concessão) para colocar um trem metropolitano. Porém, com carros velhos e locomotivas velhas reformadas. Não é a melhor forma. É melhor que nada? É. Porém, a prefeita não parece estar falando sério.

Enquanto tudo isso acontece, São José do Rio Preto gastou quase um milhão de reais para fazer um trem "maria-fumaça" - como se adora dizer - para rodar em fins de semana até a primeira estação, Engenheiro Schmidt, subúrbio rural da cidade. O trem rodou uma vez, já faz tempo, é horroroso (parece um ônibus velho sobre trilhos) e não se sabe se vai voltar a andar. E o milhão de reais?

As vaporosas de brinquedo de Paraguaçu Paulista e de outras cidades também estão paradas. Quanto já se gastou nisso? Olhem, se isso for uma iniciativa particular, eu não me oponho. Mas gastar dinheiro público?

Que os defensores dos trenzinhos de brinquedo fiquem de olhos abertos: o "trem republicano" de Itu, que foi lançado (a ideia) em 2010 com - claro - dinheiro público - até hoje não rodou. Poucos trilhos da linha velha foram recolocados, não há locomotiva, estações (a de Salto) com obras paradas...

E eu fazendo papel de antipático. "Como pode um sujeito que adora ferrovias pensar desse jeito?", já ouvi. Bom, eu não acho que o govrno tenha de investir dinheiro alto em coisas que geralmente quando começam, param logo em seguida. Enquanto isso, a saúde, a educação, o transporte público contínuo...

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

FERROVIAS PAULISTAS - O FIM ESTÁ PRÓXIMO?

Estações sem linhas: típico no interior. Foto Mario Favaretto
Todas as menções que faço no meu site www.estacoesferroviarias.com.br levam em conta as ferrovias que existiram antigamente. Embora todas as ferrovias que já existiram no país sejam citadas em cada folha de cada estação ferroviária (tipo: Estação da Luz, São Paulo Railway, 1867-1946; E. F. Santos a Jundiaí, 1946-1975; RFFSA, 1975-1994; CPTM, 1994-2014), a estrutura do site é baseada nas linhas originais das ferrovias originais.

Se eu usasse a FEPASA como referência, na verdade, complicaria as coisas, pois quando esta empresa foi formada, civersas linhas já haviam sido extintas; vejam, por exemplo, que na formação da FEPASA (novembro de 1971), ela foi formada por cinco ferrovias que pertenciam ao Estado de São Paulo (Paulista, Mogiana, Sorocabana, E. F. Araraquara e E. F. São Paulo a Minas e mais o espólio da E. F. Bragantina, desativada quatro anos antes).

Fora estas cinco, ainda existiam a RFFSA, que era, em São Paulo, a junção da três estradas de ferro (Santos-Jundiaí, Noroeste e Central do Brasil) e ainda existia a E. F. Campos do Jordão, que não se uniu a nehuma delas, embora fosse estadual. E ainda havia a E. F. Perus-Pirapora, particular.

Das onze ferrovias citadas acima, a EFPP, a Bragantina, a SPM, a EFCJ, a Noroeste, a EFSJ e a EFA - sete, portanto - foram sempre o que foram. Não compraram, não haviam se juntado a outras (exceçãozinha: a EFSJ, ainda no tempo da SPR, adquiriu as linhas da Bragantina. Porém, quando a SPR tornou-se EFSJ, a a Bragantina foi separada e ficou com o governo do Estado).

Ficam, então, a Sorocabana, a Paulista, a Mogiana e a Central do Brasil, que, em São Paulo, haviam adquirido várias outras ferrovias precursoras a elas. E. F. Barra Bonita, Cia. do Vale do Rio Dourado (Douradense), E. F. de Jaboticabal, E. F. de Morro Agudo, Cia. Rioclarense, Cia. São Paulo a Goiaz, Ramal Férreo do Rio Pardo, E. F. de Cravinhos, Southern São Paulo Railway, Cia. Ytuana, Cia. Funilense. E. F. Lorena a Piquete, E. F. de Bananal e possivelmente outras que não me vêm á cabeça agora.

Afora estas, a E. F. Itatibense e a E. F. Resende a Bocaina terminaram seus dias sem ser adquiridas por ninguém.

É de espantar a quantidade de fusões e compras que ocorreram desde os primórdios ferroviários em São Paulo.

Quando houve a privatização da RFFSA e posteriormente da FEPASA, várias das linhas que sobravam se juntaram, na esperança governamental que isto melhorasse o desempenho das linhas, abandonadas em grande parte no final dos anos 1990. O que ocorreu foi bem diferente: pelo menos em São Paulo e sem entrar na discussão em outros estados, senão prolongar-nos-emos demais no assunto, as "malhas" vendidas, que caíram inicialmente nas mãos da Ferroban (toda a FEPASA), da MRS (EFSJ e Central) e da Novoeste (a Noroeste). Poucos anos depois, isso já estava tudo mudado, a ALL apareceu e comprou a Novoeste e parte da Sorocabana, depois toda ela e a Paulista, a EFA... A Mogiana foi parar nas maõs da FCA, aí agora vem a Rumo...

Se o problema fosse somente troca de donos ou de nomes, mas não: a situação é caótica, não há manutenção, vários trechos foram completamente abandonados (ramal de Piracicaba, SPM, Alta Paulista, ramal de Juquiá... e o governo fica olhando, apenas.

Trens de passageiros nem sonhar, mesmo nas linhas abandonadas (a Alta Paulista e a Santos-Juquiá dariam excelentes linhas, com poucas reformas e bastante público potencial para usá-las). As exceções em tudo isso foram a Campos do Jordão, que começou a ser radicalmente melhorada (nunca esteve parada) há quatro anos atrás e a CPTM, que usa os trechos urbanos das antigas linhas da Sorocabana, Central e EFSJ, fazendo um bom serviço em conjunto com as linhas do metrô paulistano.

Porém, para recuperar as linhas do interior, que estão abandonadas e mesmo usadas, há muito o que fazer. E não está sendo feito. Tristeza. A infraestrutura brasileira NÃO agradece. O povo brasileiro só tem a perder com o que acontece, todos vêem, somente não vê quem não quer.

Enquanto isso, algumas prefeituras do interior lutam para estabelecer trenzinhos de brinquedo, vaporeiras anacrônicas de fins de semana. Sobra apenas comentar que a ABPF faz um excelente trabalho na ferrovia Campinas-Jaguariúna, que um dia foi a linha da Mogiana e hoje somente é usada por ela. Mas, graças a Deus, é uma instituição privada. Já a E. F. Perus-Pirapora, com um trecho pequeno, vinha sendo bem administrada por uma associação que nos últimos meses parece ter perdido o rumo.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

CARTA PARA O DOUGLAS (SERIA MENTIRA?)

Douglas, você em sua estada aí no Paraíso Terrestre já há quase duas semanas, não sabe da novidade.

Sabe aqueles e-mails que a gente recebe e não acredita? Que ganhamos na loteria não sei onde e precisamos mandar a conta para receber o dinheiro? Aqueles milionários africanos que, perseguidos, decidem dividir a fortuna deles conosco? Recebi centenas deles nos últimos anos. Não deletei. Resolvi afinal responder a todos, e era tudo verdade! Nós é que somos desconfiados demais, as pessoas são boas e não más!

Com isso, recebi uma fortuna incalculável. Sou agora, de longe, o homem mais rico do planeta. Resolvi, então, aproveitar uma pequena parte desse dinheiro e fazer algo que sempre quis. Sabe aquela cidade onde você mora e na qual eu sempre meti o pau? Eu a comprei inteirinha. Sim, comprei toda a cidade de Guarulhos. Por que Guarulhos? Ora, por que eu cismei com ela. Feia e mal administrada, foi ela que escolhi. Existem tantas, afinal...

O que fiz então a partir do minuto seguinte à sua partida do aeroporto?

Comprei todos os imóveis da cidade, todos os terrenos, tudo. Demoli todas as construções. Todas, não - ficaram algumas. Todas as tombadas e as que você indicou que deveriam ser e ainda estavam de pé. Mantive o aeroporto, que, apesar de ser uma porcaria, causaria um caos na cidade de São Paulo sem ele. E fiz várias melhorias. O governo não precisará mais se importar em gastar dinheiro com sua ampliação e reformas. Quando v. voltar, encontrará um aeroporto totalmente reformulado e um dos melhores do mundo. O que o dinheiro não pode fazer?

Mantive a via Dutra para não prejudicar o tráfego entre São Paulo e o vale do Paraíba. Todos os terrenos vazios com as demolições em massa - aproximadamente 99% da cidade - foram gramados e arborizados. Algumas poucas avenidas foram mantidas. Não se preocupe com o seu apartamento. O prédio foi demolido também, mas conservei seus móveis e livros todos e transportei-os para a sua nova residência: o Palacete Sarraceni, que mandei reconstruir nos seus mínimos detalhes e que estão já acomodando seus móveis no exato local em que estava antes.

Também ficaram de pé a estação de Guarulhos da Cantareira, a Base Militar e o Shopping Center da antiga fábrica da Olivetti. Deixei também um hotel, o Ibis. E, claro, a Prefeitura - afinal, o prefeito continua sendo prefeito do que restou.

Reconstruí a linha do antigo Tramway da Cantareira e coloquei trens novos para ali circularem. As estações da base de Cumbica, Torres Tibagi, Gopoúva, Vila Augusta foram reconstruídas tal qual eram. O trem já funciona com locomotivas elétricas e carros TUE. Cada um com seus horários, pelo menos 20 por dia. A linha, no entanto, para na divisa de Guarulhos com São Paulo, pois o gênio do prefeito Malddad de São Paulo não deixou que ela entrasse pelo município da Capital. Não faz mal.

Demoli aquela ponte horrorosa estaiada e pintada com o nome da cidade sobre a Dutra também. Ela me irritava. Todos os rios e córregos que Guarulhos já teve a céu aberto e limpos um dia estão de volta em seus leitos e limpíssimos. Os poucos habitantes que sobraram pescam dourados e se divertem.

Ah, que maravilha é ser quaquilionário... até o tio Patinhas está com ciúmes de mim. Guarulhos passou de uma das cidades mais feias do Brasil e do mundo a uma das mais bonitas. Você vai gostar.

Estou agora pensando qual outra cidade vou recuperar. Depois lhe dou mais notícias. Qualquer dúvida que v. tiver ao voltar para casa, entre em contato comigo.

Seu amigo, Ralph.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

MAIS UMA ESTAÇÃO PARA O CHÃO: VARGEM GRANDE DO SUL, SP

A estação já em faze final de demolição. Não foi difíil, estava tudo podre. A foto é do dia do início da demolição. Foto da Gazeta de Vargem Grande.

Na sexta-feira de manhã, dia 14 de fevereiro último, mais uma estação ferroviária, esta inativa havia já cinquenta e dois anos, foi demolida. Foi a de Vargem Grande do Sul, ponta de um ramal de uma estação só e que saía da estação na linha-tronco da Mogiana, Lagoa, mais tarde Lagoa Branca, situada num bairro rural do município de Casa Branca. Eu soube da notícia no mesmo dia, logo depois de tratores iniciarem o seu arrasamento.

Mandaram-me um e-mail com o link de um jornal virtual da cidade que dizia que a Prefeitura hacia declarado a estação de "utilidade pública" em 1911. Não sei exatamente qual era a intenção, não era nada claro. A família que a comprou (veja abaixo) te-lo-á feito logo depois disso? A estação era da Prefeitura ou já era da família? De qualquer forma, não era um tombamento.

Desde que visitei a cidade pela primeira vez, em 2000, a estação estava em péssimo estado. Tenho até um amigo que mora na cidade desde essa época que cansou de "brigar" na cidade para arrumar interessados, políticos ou não, e tentar salvar o prédio. Desistiu, já há algum tempo.
A estação no dia anterior à demolição (13 de fevereiro de 2014). Foto da Gazeta de Vargem Grande.

É o típico exemplo de cidade que, embora não tenha nascido ao redor da estação ferroviária, fez muito dinheiro e deu muitos empregos na região por causa da existência da linha. O ramal foi construído e aberto em 1909 pela Mogiana e tinha pouco mais de dezenove quilômetros.

Chegou-se a estudar nos primeiros anos seguintes à abertura do ramal um prolongamento da linha até a vila do Espírito Santo do Rio do Peixe, passando por São Sebastião da Grama. Mas não saiu.
A estação logo após a inauguração em 1909.

Enquanto havia café na região e estradas ruins, o ramal foi bem. Nos anos 1950 a situação do ramal já era ruim, com pouquíssima carga e já se falava no fechamento da linha. Finalmente, no último dia de 1960, o ramal teve o trem correndo nele pela última vez. Na época, a Mogiana continuou a usar o prédio como "agência rodoferroviária", ou seja, para receber e enviar cargas eventuais para a estação mais próxima (podia ser Lagoa Branca ou Itobi, ou mesmo Casa Branca). Porém, funcionou por muito pouco tempo e fechou.

Quando lá estive em 2000, o prédio, ou parte dele, era usado por uma oficina mecânica, mas também mantida como se fosse uma favela. Logo depois veio o abandono de vez. A prefeitura parece jamais ter se interessado por ele. Foi um verdadeiro milagres o prédio ter ficado em pé por todos esses cinquenta anos.

Há algum tempo, uma família o adquiriu. E agora o derrubou. Ela tinha esse direito. O que vai fazer lá, nem procurei saber. O último resquício da ferrovia se foi. Não era um prédio bonito: era longo, acomodava tanto a estação de passageiros quanto o armazém, mas a arquitetura era bem típica das estações mais pobrezinhas da velha Comapnhia Mogiana. Provavelmente foi construído e entregue junto com o ramal, não deve ter havido "estação provisória".

Como eu comentei nas redes sociais, para mim, a cidade demoliu mais de cinquenta por cento de sua história. Uma tragédia que parece não ter incomodado a esmagadora maioria dos 39.200 habitantes da cidade. Daqui a poucos anos, quando se perguntar algo do tipo "onde era a estação ferroviária?" vai-se ter como resposta "aqui passava trem?" Triste. A cidade não tem futuro, vivendo de agricultura e com poucos empregos. Nos sites da Prefeitura e da Wikipedia não é citada a data de fundação. No da Prefeitura, nem a história da cidade é contada. Falar em ferrovia? Nem pensar.

O pior é que isso vem acontecendo sem parar. Dentro de cidades, fora delas, estações de fazendas, está tudo vindo ao chão, demolidas ou "caídas" por ação do tempo. Não temos memória, não temos história, não temos uma nação.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

SÃO PAULO: ENXERGANDO A 3,2 QUILÔMETROS

Lá no fundo, o conjunto de prédios do Jardim e o meu prédio, com janelas brancas devido ao reflexo da luz. Foto minha.
Ajudei um conhecido meu a alugar um apartamento num prédio da rua Eugenio Betarello, no Jardim Guedala, há cerca de um mês. Meu filho descobriu que da janela do prédio (no 10o andar) era possível ver o prédio em que trabalho na Faria Lima.

Eu realmente achei estranho, pois há uma grande distância (mais de três quilômetros) em linha reta entre eles, fora uma sequência de sobe-desces no trajeto entre eles, que basicamente é a avenida Eusebio Matoso e sua continuação, a Francisco Morato.

Mas fui olhar da janela do 8o andar do meu prédio e lá estava, no horizonte, o tal prédio - na verdade, um conjunto de quatro prédios iguais.
Google Maps: a rua Eugenio Betarello, sem nome no mapa, está muito próxima a onde está assinalado o Supermercado Pão de Açúcar, no canto esquerdo inferior do mapa. A esquina da Faria Lima com a Eusebio Matoso pode ser vista no canto direito superior direito do mapa.

Dizem que o horizonte está sempre a 18 quilômetros de nós. Isto é verdadeiro no mar ou na praia olhando para o mar, mas numa cidade cheia de colinas não vale. Olhando do meu prédio está o outro a 3,2 quilômetros, mas, do contrário, a distância é maior, pois de lá se vê não somente o meu prédio, a 720 m de altura do mar, como também os prédios da avenida Paulista, pelo menos a mais quatro quilômetros do que os 3,2 já citados.

Fotografei de um prédio e de outro. O que se vê é o que as fotos mostram. Na foto do topo do artigo, aparece o meu prédio, aquele que tem janelas brancas (na verdade, reflexo do sol nos vidros abertos) na Faria Lima.  Ao fundo, no horizonte, a avenida Paulista, a 800 metros de altitude em relação ao mar e 80 metros acima do rio Pinheiros.

Em primeiro plano, o bairro do Jardim Guedala, seguido de outros, até chegar ao rio Pinheiros - que não dá para ver - depois os prédios da região da Faria Lima e mais acima os prédios de Cerqueira César, com os da Paulista no topo.
No centro da foto, os prédios do Jardim Guedala no horizonte. São os da esquerda. As árvores em primeiro plano são todas do lado de cá do Pinheiros - neste caso, "cá" é a região do Shopping Eldorado. Foto minha.
Do outro lado, ou seja, fotografando do meu prédio, a foto logo acima. Lá no fundo, o conjunto de quatro prédios mais escuros à esquerda está na rua Eugenio Betarello, esta uma paralela à avenida Francisco Morato maquele ponto, do lado esquerdo de quem segue para o Taboão. A "floresta" que aparece na foto está praticamente toda antes do rio Pinheiros, já que as árvores do Jardim Paulistano em volta do Shopping Eldorado não aparecem, pois o terreno ali é mais baixo que os do Jardim Guedala e de outros após este.
Foto com maior aproximação tirada por mim desde o Jardim Guedala. Pode-se ver mais facilmente o prédio de janelas brancas pelo sol.
Toda esta região era mata até cerca de 60 anos atrás, prédios nem pensar. A mesma foto tirada nessa época não mostraria edifício algum do rio Pinheiros para cá - e cá, é o Guedala.

E São Paulo vai mudando.

sábado, 15 de fevereiro de 2014

COMPANHIA CITY - UM POUCO DE HISTÓRIA


A Companhia City, de São Paulo, foi fundada por ingleses por volta de 1912 na Capital Paulista. Embora seu primeiro loteamento tenha sido feito em 1912/13 num ligar próximo ao Anhangabaú, no centro novo da cidade, ao longo do que 25 anos mais tarde seria a avenida Nove de Julho (na época, o vale do córrego Saracura), cuja rua principal é a Avanhandava, o seu nome realmente se cristalizou em cima do Jardim América, lançado em 1913/14 (nota: as datas exatas estão em livros meus que não fui à procura para confirmar, para não perder muito tempo na exatidão destes fatos, visto que hoje em dia tempo para mim é fundamental.)
Jardim America, 1930 - A Gazeta
A primeira casa construída no Jardim América foi a que ficava na esquina das ruas Honduras e Colômbia, em 1915, e infelizmente demolida há cerca de uns quinze anos atrás. Para construir esse bairro, rigorosamente para ricos, ela drenou com enorme sucesso toda o vale do córrego da Várzea, enorme charco que existia entre as atuais ruas Estados Unidos, Groenlândia (parte da lendária Estrada da Boiada), rua Atlântica e Nove de Julho. A única rua então existente eram exatamente uma das limítrofes, a Estrada da Boiada, que ainda tinha esse nome, vindo de Pinheiros e seguindo até o Matadouro da Vila Mariana e intransitável para os poucos automóveis que existiam então.

As ruas do Jardim América nomeadas com os nomes de países americanos. As ruas foram construídas de forma a evitar o que já imaginavam que viria: o tráfego pesado. Em parte, conseguiram. Hoje em dia, no entanto, há algumas das ruas que carregam trânsito bastante significativo, sempre em mão única. As duas únicas ruas retas eram a Colômbia (continuação da rua Augusta), a Brasil e as três limítrofes Atlântica, Estados Unidos e Groenlândia.
Primordios do Pacaembu, anos 1930 - Autor desconhecido

A partir daí, vieram outros bairros sempre construídos no mesmo estilo, como o Pacaembu (anos 1930) e muitos outros; quase todos podem ser vistos no mapa que foi colocado aqui nesta postagem e publicado como anúncio em 13 de maio de 1962, quando a City estava completando cinquenta anos. Houve outros bairros lançados mais tarde, como por exemplo o City Anhanguera, no final dos anos 1970.

O Jardim América permaneceu como o mais famoso. Suas escrituras de compra e venda de terrenos não permitiam a construção de prédios e estabelecimentos comerciais (exceção aberta ao Clube Paulistano e ao Clube Harmonia).

Vale notar que os terrenos da rua Atlântica, Estados Unidos e Nove de Julho do "lado de fora" do perímetro também foram loteados pela City. Estabelecimentos comerciais foram mais tarde liberados, depois de muita pressão, na rua Colômbia e na avenida Brasil, ambas de tráfego intenso. Oficialmente, as casas das outras ruas somente podem ter finalidade residencial. O bairro foi tombado pelo Condephaat.
Jardim Guedala, 2014 - foto Ralph Giesbrecht

À medida em que os bairros foram sendo lançados e dependendo também da sua distância do centro, o nível exigido de regras foi diminuindo. Não se pode comparar o Jardim América a nenhum outro bairro lançado por eles, sendo o Pacaembu o que mais se aproxima. Também foi tombado. Vale lembrar que, ao contrário do que muitos pensam, o Jardim Europa, de 1922, não foi um loteamento promovido pela City.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

FERROVIAS, SAÚDE, EDUCAÇÃO E SEGURANÇA


Neste blog que já está perto de completar cinco anos, minha intenção era de escrever o máximo possível sobre as estradas de ferro brasileiras, suas infindáveis histórias e sua triste história. Quando escrevi, há já pouco mais de doze anos, o livro Um dia o Trem passou por aqui - a história e as estórias dos trens de passageiros do Estado de São Paulo e as lembranças que eles deixaram, não esperava que tanta gente se emocionasse com ele.

Recebi por muitos anos (hoje o livro está esgotado) o relato de pessoas, velhas e jovens, que chegaram a chorar com o que leram. Nada foi inventado por mim. Boa parte das pessoas gostava dos trens e ficaram tristes com a sua erradicação, com o seu armagedon, seu apocalipse, enfim, com o seu fim da forma que foi feita em São Paulo e no Brasil.

Depois disso li muito, pesquisei muito sobre estradas de ferro no Brasil inteiro. Ainda faço isso e devo continuar fazendo, Recebo a ajuda de muita gente pelo Brasil e pelo mundo afora com suas histórias, fotografias e fatos que me ajudam a aumentar cada ve mais meu site www.estacoesferroviarias.com.br, onde mostro as quase 5 mil estações brasileiras, quase todas elas abandonadas, demolidas ou mesmo conservadas servindo para fins para os quais não foram construídas.

É uma gota d'água no oceano, enfim. Tenho contado muitas dessas coisas aqui. Mas percebi que eu me repito muito. Com raríssimas exceções, a história de cada linha férrea no país é uma sequência de desgraças que prejudicou e ainda prejudica muita gente.

E mesmo quando escrevo sobre outros assuntos - histórias da cidade em que nasci, São Paulo - quase sempre há uma pontinha que fala de trens e de metrôs, de trens metropolitanos e de bondes.

Porém, certamente as ferrovias - ou a sua falta e seu desinteresse pelos governos federal, estadual e municipal, salvo poucas exceções - não são o que há atualmente de mais importante no Brasil.

O que estamos vendo hoje e que, na verdade, acontece desde que eu nasci há sessenta e dois anos, há outros itens muito, mas muito mais importantes: educação, saúde e segurança. E eu, insistindo em falar de ferrovias e da cidade de São Paulo. Faz sentido?

Os três itens citados se misturam, se enroscam. A soma de uma eventual melhoria em cada um deles é maior do que a matemática simples. Mas, como acontece com as ferrovias, nada se faz, ou nada se faz corretamente. Enquanto se compram máquinas para hospitais em profusão, por que o país delas precisa, por outro lado, muitas ficam estocadas por anos em armazéns por causa de uma burocracia qualquer. E se estragam. E se são postas para funcionar imediatamente, assim que dão algum defeito, demoram tanto para consertar - é a maldita burocracia - que, quando (e se) o fazem, já estão superadas ou não há mais peças. Faltam remédios, Faltam leitos em hospitais e pronto-socorros.

Faltam médicos em inúmeras cidades. Aí, trazem médicos de fora, os cubanos, principalmente. Com salários de fome. Salários de fome que eles somente descobrem que o é depois de trabalharem por algumas semanas nos fins-de-mundo a que são enviados. Aí eles fogem. Isto já começou a acontecer.

E educação? Professores ganham muito mal. Há exceções? Claro. Poucas escolas, no entanto, são boas. Até algumas escolas particulares começam a ter o nível em rampa descendente. Materiais, uniformes e merendas são entregues com atraso de, às vezes, meses. Querem que o aluno aprenda? Não reprovam, mesmo se o seu desempenho for ridículo. Dão cotas raciais, ou de classe social, etc. O que resolve isto? Nada - só aumenta o racismo, latente no Brasil ainda pois a mistura de raças é enorme.

Segurança? Direitos humanos só se preocupam com bandidos. Policiais, quando atiram em alguém, são processados. Os bandidos são aprisionados e soltos. Muitos bandidos assassinos não têm solução - não vão se recuperar nunca, pois já nasceram em geral numa família que na prática nunca chegou a se constituir, seja por falta de dinheiro ou por falta de educação dos pais - e pela falta de diálogo. Diálogo só existe hoje dentro de casa com lap-tops, computadores, i-pads, i-phones. O tráfico de drogas atinge a todos - alguns, mais espertos, deixam para lá e não se metem com drogas - mas muitos inexperientes não conseguem resistir a elas e acabam com suas vidas.

Em alguns bairros de São Paulo não se pode andar nas ruas, ocupadas desde a calçada até o leito por drogados. Não tenha penas deles. A escolha foi deles. Não tem volta. E aí, misturam-se as "elites" dos petistas e os favelados. Ricos e pobres entram no mesmo barco.

Isto tudo somado, com um governo que promove a discórdia de classes como um objetivo ou mesmo para justificar sua falta de sucesso nos governos, queremos o que? O fato mais recente veio anteontem, quando o prefeitinho de São Paulo dizze que as elites é que prejudicam seus feitos - que feitos: Só fez besteiras até agora. É caso de renunciar e carregar o saco e voltar para casa, que venha outro prefeito. Cada um que tem saído, dizemos que não poderá haver outro pior - mas isto não estpa acontecendo. O seguinte tem sido sempre pior. Põe a culpa no antecessor e, claro, nos ricos - os ricos e a classe média, que sempre sustentaram o Estado, por bem ou por mal.

E querem que eu conte histórias de trenzinhos que fazem chu-chu? Eu posso até contar, mas começo a me sentir culpado por insistir em algo que aparentemente interessa apenas aos quase cem interessados no assunto que conheço. A situação pe tal que até os jornais escritos e falados falam mal dos trens da CPTM e do metrô paulistano quase todos os dias. Por acaso eles são ruins? São eles os culpados do excesso de demanda? Será que ninguém se lembra de como era o estado precário dos trens da CPTM até o final dos anos 1999?

Chega, gente - vou tomar forças para, daqui a alguns dias, tentar escrever sobre trens de novo sem muita culpa na cabeça.


domingo, 9 de fevereiro de 2014

NOMES DAS RUAS DE SÃO PAULO: CURIOSIDADES

Mapa de 1916 da região da Villa America.
Enquanto a cidade era pequena, os motivos dos nomes das ruas existentes eram claros. Onde havia a quitanda, era a rua da Quitanda. Onde morava alguém importante, era o nome dele que prevalecia - rua do Manuel Carlos (hoje Florencio de Abreu). Se a rua levava para um local importante, igrejas, por exemplo, era como a rua de São Bento (para o mosteiro) e para outra igreja (de São Pedro - rua "direita"ou direta para ela). O Pátio do Colégio era a praça onde estava... o colégio dos jesuítas.

Mais longe, a estrada de Sorocaba, de Santo Amaro. A rua Tamanduateí dava no rio do mesmo nome. a rua da Consolação para a Igreja da Consolação. A estrada de São Miguel. A estrada do Rio de Janeiro. A estrada de Parnaíba (para a hoje Santana de Parnaíba, que tem diversos nomes hoje, inclusive avenida Mutinga).

Somente no final do século XIX começaram as homenagens a gente que na enorme maioria das vezes nada tinha a ver com a via. Poucas ruas nomeadas, pleo menos proporcionalmente, tiveram os nomes dados para homenagear gente da rua ou do bairro.

Uma das poucas exceções é o bairro do Jardim Paulistano (originalmente entre as atuais ruas Groenlândia, Rebouças, Faria Lima e Gabriel Monteiro da Silva). Muitos nomes nesse bairro são de gente a quem pertenciam as terras que deram origem ao bairro, ou mesmo moravam lá - basicamente, da família Rosa. Ruas Doutor Rosa (hoje Sampaio Vidal), Boaventura Rosa (trecho da Rebouças entre a Groenlandia e a Faria Lima), Maria Carolina, Mariana Correa, Prudente Correa, Marieta, dona Hipolita (hoje Gabriel Monteiro da Silva) e mesmo o nome de Gabriel, que era genro de Hipolita e morou na atual além da que leva seu nome.

Mas e o resto? Há casos interessantes, como o da Villa America. Originalmente, o bairro - que hoje se chama Cerqueira César - foi loteado na região entre a avenida Rebouças e avenida Paulista, vale do córrego da Varzea (onde hoje está a Nove de Julho, do túnel até o sim, na Cidade Jardim) e a rua Estados Unidos atual. Na verdade, ultrapassava o córrego da Varzea - onde não havia caminho algum - e chegava à Estrada de Santo Amaro (avenida Brigadeiro Luiz Antonio).

Com algumas reentrâncias no terreno para além da avenida Paulista, esse loteamento foi feito conjuntamente com a abertura da avenida Paulista em 1891. As ruas basicamente foram (isto é bastante claro) nomeadas com os nomes de cidades paulistas. Mas a questão é: que critério foi utilizado para escolher as cidades que as nomeariam?

Parece que foram escolhidas pelo critério que seria mais óbvio: a importância, tradição e riqueza das cidades da época. Só que, com certeza, o numero das cidades nestas condições era bem maiordo que o número de ruas existentes. E ainda sssim, já na virada do século XX, várias ruas já tinham o nome de pessoas (Padre João Manuel, Rocha Azevedo, Peixoto Gomide, por exemplo). Teriam elas tido nomes de cidades no início do loateamento?

Vamos analisar o nome de cada cidade que deu nome às ruas. Hoje, são quase todas alamedas, mas inicialmente em alguns mapas antigos apareciam como ruas: rua Santos, rua Rocha Azevedo, etc. Os nomes: alameda Ribeirão Preto - cidade que estava se tornando uma das mais ricas do Estado na época; trinta anos antes, era ainda um vilarejo nos confins da província. Rua (não alameda) São Carlos do Pinhal - enriqueceu muito com a chegada da ferrovia em 1884 e pertencia praticamente inteira ao Conde do Pinhal da familia Arruda Botelho.

Avenida Paulista - levou o nome dos habitantes e do qualificativo do Estado de São Paulo.

Descendo para o vale do rio Pinheiros: Santos - a segunda maior cidade do Estado, e tradicionalíssima por sempre ter tido um porto forte. Jaú - terra de muito café nesse tempo. Itu - terra tradicional, uma das cidades mais antigas do Estado e reduto dos republicanos. Franca - terra de muito café. Tietê - hoje decadente, era ainda uma cidade rica com café e açúcar (o trecho depois da Padre João Manuel até a Brigadeiro Luiz Antonio mudou o nome para José Maria Lisboa, provavelmente porque havia uma descontinuidade do leito dessa rua nesse ponto - até hoje). Lorena: na época, já decadente por causa do café que ia sumindo no Vale do Paraíba, mas que mantinha um povp de muita tradição, como cidade antiga. Finalmente, a alameda Iguape - no início dos anos 1930, teve o nome alterado para Oscar Freire, um médico da Faculdade de Medicina que faleceu naquela época.

Cruzando essas ruas no "tabuleiro de xadrez", pela ordem (sentido Rebouças-Brigadeiro), vemos que a maioria não têm, pelo menos hoje, nomes de cidades. Por que? Sae Deus. Como disse, talvez todas originalmente tenham-nos tido - mas isso é mera especulação de minha parte. Falarei somente das que o têm, mas antes falarei da Rocha Azevedo: eu encontrei um mapa d século XIX que a chamava de alameda Limeira. Mas não consigo encontrálo de novo. Limeira era, na época, uma cidade rica, com ferrovia e muita laranja - além de café. Depois: Casa Branca - hoje uma cidade decadentíssima, era na época entroncamento da Cia. Mogiana, com muitos depósitos de café que traziam riqueza para a cidade. Campinas - sempre foi uma cidade rica desde a fundação, mas curiosamente atravessava uma crise enorme por causa da febre amarela que grassava no interior paulista.

No meio dessas ruas estão ruas como Bela Cintra, Haddock Lobo e Augusta, eram da Pamplona - as duas primeiras consideradas ruas "chics"e as duas últimas ruas de intenso comércio mais popular. Não por coincidência, eram as únicas do loteamento (fora a avenida Paulista) que tinham linhas de bondes, o que favorecia o estabelecimento de casas comerciais que lá estão até hoje.




sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

SÃO PAULO VAI MUDANDO...

Av. Santo Amaro em 1913 entre av. Aguas Espraiadas e rua Florida, com a rua Michigan no meio (Google Maps).

Hoje passei pela avenida Santo Amaro, de carro, vindo do bairro do mesmo nome no sentido centro da cidade. É um caminho que antigamente eu fazia muitas vezes, mas que nos últimos anos não tenho passado.

Fiquei surpreso com o que vi. Cheguei ao escritório e abri o Google Maps, com a esperançca de que a imagem ainda fosse diferente da de hoje, ou seja, depois da mudança que ali ocorreu.

As duas imagens que mostro aqui foram extraídas do próprio. A do topo da página mostra a avenida, sentido Santo Amaro-centro apontando para o norte (ou nordeste, como queiram). Vejam a rua Florida, saindo da avenida para a esquerda (o nome está na foto). Dali para o sul, a avenida passou a fazer uma curva para a esquerda (na foto) do leito original, cruzando a outra avenida que aparece no canto da foto (Aguas Espraiadas, também chamada de Roberto Marinho) e chegando, depois de fazer uma "barriga" mais para o sudoeste, abaixo do cruzamento, para se juntar ao leito original de novo.
Casas que não existem mais entre as ruas Michigan e Florida. (Google Maps, 2013).

Resultado: as casinhas entre a Aguas Espraiadas e a rua Florida, mais próximas à avenida Santo Amaro, foram para o chão. Ficaram alguns terrenos vazios e cercados e a avenida encostando nos prédios e casas que ainda ficaram. Já do lado interno da barriga, foi tudo cercado.

Toda essa obra deve ser para a construção de uma estação para entroncar o metrô, linha 5 lilás, que passará sob a velha avenida, com a linha 17 (é isso mesmo? Essa numeração me confunde) que está sendo construída no canteiro central (aliás, onde o córrego das Águas Espraiadas está a céu aberto) em elevado com um monotrilho sobre ele.

Vindo de Santo Amaro, pouco antes das Aguas Espraiadas, você pode escolher seguir pela pista antiga da direita da Santo Amaro ou entrar na barriga à esquerda.
Av. Santo Amaro; rua Demostenes sai à direita (Google Maps, 2013).
Seguindo para a cidade, logo depois, quando se cruza a rua Demóstenes (na foto logo acima, ela sai à direita, no canto inferior esquerdo, mas não está com o nome no mapa), do lado direito, o terreno onde se vêem várias casas, no centro da foto, não se vê hoje nada, apenas uma placa para o lançamento de um grande conjunto de prédios (desculpem-me, torres) de apartamentos residenciais. Pergunto pela enésima vez: a cidade precisa de mais prédios de apartamentos? As casas, claro, foram para o chão.

E assom, a cidade muda, mais para pior do que para melhor. E vamos que vamos.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

MARILIA - O MUNICÍPIO em 1929

O Estado de S. Paulo, 4/4/1928.
O jornal O Estado de S. Paulo de 4 de abril de 1929 fala sobre a instalação do município de Marilia, a ser realizada naquele mesmo dia.

A estação havia sido inaugurada no dia 30 de dezembro anterior; dali para a frente, o que se chamava até então de Alto Cafezal passaria a ser o município de Marília, nome vindo do livro Marilia de Dirceu, de Thomaz Antonio Gonzaga, ideia de Bento de Abreu de Sampaio Vidal, político que tinha ficado rico negociando terras na região da E. F. Noroeste e da Alta Paulista.

A região era, como o era ainda boa parte do oeste paulista, meio que terra de ninguém; apenas os corredores da Noroeste do Brasil, ao norte da linha da Companhia Paulista, e da Sorocabana, ao sul, haviam sido povoados então. O resto estava ainda por vir.

As histórias que li sobre a expansão dessas linhas e do "tronco oeste" da Cia. Paulista foram muitas. Em algumas literaturas diz-se que o municipio havia se desmembrado de Cafelandia; em outras fontes, falam que o foi de Campos Novos. No jornal nada se falava sobre isso, mas o artigo cultuava os "novos bandeirantes" que iam seguidamente povoando o interior paulista. A região vinha sendo povoada, na verdade, desde o avanço dos primeiros bandeirantes no início do século XVII, mas muito lentamente, graças às péssimas comunicações e à resistência dos indígenas. Este artigo meu baseia-se bastante na reportagem desse dia.

A estação deveria se chamar Lácio, para seguir o famoso alfabeto da Paulista para dar nomes ás estações após Piratininga começando pela letra A.

E vieram as estações de América (depois Alba), Brasilia, Cabralia, Duartina, Esmeralda, Fernão Dias (hoje Fernão). Depois, Galia, Hesperia (nunca passou de uma parada com casas de turma), Incas (Garça), Java e Kentucky (Vera Cruz). Até Fernão Dias, as estações iam seguindo temas da história brasileira. Depois, a partir de Galia, já se preocupava apenas em seguir o alfabeto com nomes que agradassem aos acionistas. América mudou para Alba, sabe-se Deus por que. Duartina veio de Duarte da Costa, primeiro governador-geral do Brasil. Finalmente, a linha entre Piratininga e Garça foi toda arrancada em 1976 com a construção de uma variante bem mais curta ao norte da linha original.

Na letra L, seria a vez de Alto Cafezal. Escolheram Lacio e esse deveria ser o nome da estação de Marilia. Só que à última hora decidiu-se construir uma estação antes do Alto Cafezal e esta tomou o nome previsto. Agora, a nova estação teria de ser com M e saiu, como já dito, Marilia. Depois, pode-se ver no mapa previstas ainda as estações de Nipônia, Ormuz e Pompeia. Nipônia, quando instalada alguns anos depois, tomou o nome de Padre Nóbrega. (Nota: uma estação chamada de Nova Nipônia existia na linha da Noroeste desde 1910). Ormuz, de Oriente. O nome de Pompeia manteve-se e a estação foi aberta em 1935. Vejam, porém que em 1929, a cidade já deveria estar bem adiantada, mesmo sem a estação ainda construída e linha chegando até ela, pois foi agraciada como distrito de paz dentro do novo município de Marília. O município de Garça já existia.

No mapa de 1929, Vera Cruz era o nome de Kentucky. Ela, Lácio e Padre Nobrega ficaram dentro do municipio de Marilia. Hoje, Vera Cruz é município, bem como Oriente e Pompeia. Jafa ficou em Garça, onde permanece até hoje.

Enfim, histórias do povoamento de São Paulo. A linha da Paulista foi avançando não tão rapidamente assim. O alfabeto, com algumas falhas, acabou na estação de Universo, aberta em 1947.e pertencente ao município de Tupã até hoje. A linha não parou aí e as novas estações passaram a ter nomes aleatórios. A última, a terminal, foi aberta em 1962 com o nome de Panorama, cidade projetada desde 1950 para ser uma metrópole na divisa do Mato Grosso, no rio Paraná. Hoje é apenas um município pobre, decadente e sem trem algum desde 2000, com a linha abandonada.

sábado, 1 de fevereiro de 2014

O PRÍNCIPE PHILLIP EM ELIHU ROOT

Folha de S. Paulo, 18/3/1962
Naquela estação ferroviária situada no antigo ramal de Descalvado, dá já lendária CPEF - Companhia Paulista de Estradas de Ferro, e tantas vezes citada aqui em artigos anteriores, aconteceu muita coisa. Como em 1962, quando lá esteve o Príncipe Philip em meio à sua visita ao Brasil. 

Esta história foi-me contada há uns doze anos pelo morador da casa da esquina do antigo leito ferroviário com a estrada que liga Araras ao rio Mogi-Guaçu e está publicada no meu site, na página desta estação. Ta,bém saiu no meu livro Caminho para Santa Veridiana (2003). Só que, até hoje, constava que a história que contarei ter-se-ia passado em 1968, quando o Príncipe Phillip, príncipe consorte da Inglaterra e do Reino Unido, vivo até hoje e próximo dos seus 90 anos, Duque de Edimburgo e ainda possuindo outros títulos mais, passou por ali. 

Segundo esse morador antigo do bairro Elihu Root - ainda chamado por muitos de Guabiroba, que era o nome até 1906 (cento e oito anos atrás!), "a estação ainda estava bem cuidada, o chefe com o uniforme impecável, enquanto a locomotiva a vapor, com o número 23 ou 25, não me lembro exatamente, chegou com duas bandeiras fincadas à sua frente, uma inglesa, outra brasileira, puxando um carro de administração; eu não me lembro se havia mais um carro de apoio ou não. A máquina era a vapor, sim, embora elas, nessa época, raramente passassem por ali. O príncipe desceu, cumprimentou meus filhos, crianças ainda, e entrou num jipe que também tinha duas bandeiras e que o levou até a fazenda Santa Cruz".
Folha de S. Paulo, 18/2/1962
A fazenda era da família Prado e dos Crespi - Fábio Prado, ex-prefeito de São Paulo nos anos 1930, filho de Martinico Prado e sobrinho do Conselheiro Antonio Prado, havia se casado com Renata Crespi, da família italiana dona do Cotonifício Crespi, que, à época, estava para fechar, ali na rua dos Trilhos, na Mooca paulistana. Mas isso não siginificava que os Crespi deixariam de ter seu dinheiro. 

Fabio Prado faleceria logo depois, em 1963; sua esposa morreria - se não me falha a memória - em 1971 e estava também no jipe que buscou o príncipe. Fabio parece tê-los aguardado na fazenda.

Por muitos anos eu tive certa dúvida que essa história fosse real. A data que citei na página de meu site foi 1968, quando o príncipe voltou ao Brasil, mas agora com sua esposa, a Rainha Elisabeth II. Só que o morador jamais citou essa data. Ele apenas falou que isso ocorrera nos anos 1960. Eu supus que o fato houvesse ocorrido em 1968.

E eis que, folheando velhos arquivos de jornais (Folha de S. Paulo) descobri que o príncipe havia estado aqui em 1962. E sua visita à fazenda Santa Cruz foi citada. E tambpem o jipe. E que ele havia ido para lá de trem. E descido em Elihu Root. O círculo estava fechado. Não havia mais dúvidas, isso não é lenda. foi um fato real.

Seis anos depois, em 1968, a estação foi rebaixada a parada, sem pompas nem circunstâncias.