quarta-feira, 24 de setembro de 2014

FESTA NA SOROCABANA!


A CPTM e a ALL resolveram homenagear a empresa dona das linhas da Sorocabana, que cada uma delas manejam hoe em trechos diferentes.

Foi emocionante. Tomaram apenas a linha-tronco (São Paulo a Presidente Epitácio) e mandaram convites a cada doador de nomes para as estações da velha linha, terminada em 1922, noventa e dois anos atrás.

Foi um sucesso. Todos compareceram. A festa ocorreu em uma composição que continha dois carros de primeira e um de segunda classe, além de um bagageiro e um carro-restaurante. Os respectivos cônjuges não foram convidados, por contenção de custos. Mas ninguém reclamou.

Também foi notado que o número de mulheres era bastante pequeno, comparado ao de homens, Melhor para elas, que foram muito mais notadas do que o normal. Havia apenas um casal, Bartira e João Ramalho, que, aliás, causaram algum constrangimento, pois apareceram nus. Mas como o clima era de festa... a eles, depois, juntou-se Paraguaçu, também sem vestimentas.

Nem todos se conheciam. Alguns eram ilustres desconhecidos e tentavam se enturmar, como Luiz Pinto e a turma dos engenheiros, o Miller, o Vazquez, o Cardoso, o Calixto, o Serra e o Romualdo. Aliás, neste grupo estava o maior número de reclamações, do tipo "por que demoliram as estações que levaram nossos nomes"? Realmente, nesse grupo, todas haviam ido para o saco. Depois, juntaram-se a eles Lopes de Oliveira, Humberto de Campos, Gabriel Piza, o Coronel Mursa, o Anisio de Moraes e o Doutor Soares Hungria, que morava perto da estação Hungria, lá em Cerquilho. Era mesmo o grupo dos "sem-estação", ou melhor, todas demolidas já.

Antes de continuar, devemos relatar que o carro menos frequentado foi o de segunda, reservado ao pessoal das linhas velhas (linhas desativadas por causa da construção de variantes e cujas estações não haviam tido suas equivalentes nas linhas novas) - eram apenas dois, Ezequiel Ramos e José Bonifácio de Andrada e Silva. Aliás, neste último, houve uma grande polêmica na comissão de convites sobre quem convidar: afinal, a estação (que já foi demolida também) homenageava qual dos três irmãos Andrada e Silva? No final, resolveram convidar o mais famoso deles e deixar o Martim Francisco e o Antonio Carlos para lá.

Os dois, com caras de borocochô, estavam ali tentando engatar conversa com os outros passageiros da segunda classe, que eram o Américo de Campos, o Caramuru, o João Teodoro e o Presidente Washington Luiz, que tiveram os nomes de suas estações trocados (respectivamente por Serra D'água, Cardoso de Almeida, Paraguaçu Paulista e Martinópolis). João Teodoro, com seu conhecido temperamento violento, queria meter uma bala no tal de Martins que foi homenageado no lugar dele em Martinópolis. Mas o Martins não estava ali, não foi convidado, pois a estação tinha um "polis" no fim do nome.

Completavm o pessoal do carro de segunda classe o Duque de Caxias (Quitaúna), Fernão Dias (Amador Bueno) Santo Antonio (Iperó) e Lara Campos (Tapijara. Santo Antonio estava inconformado de ter sido substituído pelo nome de um córrego. Justo ele, que trouxe o casamento para tanta gente...

Voltando ao lado mais animado da festa, formouse um grupinho de estrangeiros que se aboletou numa mesa do carro-restaurante, formado pela Imperatriz Leopoldina, Mailaski e o Varnhagen, além do George Oetterer. Afinal, todos falavam alemão. Houve um começo de sururu quando o Brigadeiro Tobias passou por ali e a Imperatriz lhe perguntou "como podia um senhor de tanta classe, amigo de meu filho - ela falava de Pedro II - casar-se com aquela rameira da Marquesa de Santos?" O Brigadeiro ficou na dele e pediu licença para tomar uma Coca-Cola, que ele não conhecia.

Havia também o grupinho dos religiosos, que juntou Santa Terezinha, São Roque, São João, Santa Rita, Santa Lina, São Bartolomeu e Santo Anastácio. Perguntaram onde estava Santo Antonio, que sabiam haver sido convidado, mas quando souberam que ele estava no carro de segunda, discretamente mudaram de assunto.

A rodinha dos Presidentes da República estava cheia de pompas e de arrogância, mas davam muita risada. Aceitaram receber Julio Prestes, que acusava Washington Luiz de incompetente por não ter aguentado até o dia em que seria sua posse, que nunca ocorreu. Washington não pôde se defender, pois estava na segunda classe. O Presidente Altino Arantes também conseguiu se infiltrar no grupo, embora tenha sido apenas presidente de São Paulo. Quem mais estava no grupo eram o Wenceslau Braz, o Epitácio Pessoa, o Artur Bernardes e o Prudente de Moraes, este contando vantagem porque a cidade dele foi a que mais cresceu "naquele fim de mundo que era o oeste paulista em 1918". A um dado momento, chegou Mairink, que, como banqueiro, foi muito bem recebido pelos ex-presidentes. Ficou no maior papo.

Num outro canto do restaurante, alguns políticos de menos expressão batiam papo furado, como Bernardino de Campos, Candido Mota, Domingos de Moraes, Cardoso de Almeida, Rubião Junior, Paula Souza (que não cansava de dizer que na estação dele embarcou e desembarcou o rei Eduardo VIII da Inclaterra para fazer caça à raposa na fazenda ao lado em 1931), Cerqueira César e até o Regente Feijó, que, depois de fazer o beija-mão com a Imperatriz, aboletou-se na rodinha.

O pessoal do interiorzão contava mentiras adoidadamente em uma rodinha animada: Juca Novaes, Bento Ferraz, Cesar Neto, Miranda Azevedo, Oliveira Coutinho, Alvares Machado, Batista Botelho e Jarbas Trigo.

Finalmente, batiam papo animado "lembrando os velhos tempos do Exército" o General Miguel Costa, o Antonio João e o Comandante Sampaio. Meio deslocados, ficaram trocando segredos Amador Bueno, Luiz Gama e a Jandira Sammartino, filha de Antonio e que nomeara a estação de Jandira. Mas deram-se bem, até havendo um início de paquera entre Amador e Luiz disputando Jandira.

Enfim, um sucesso!!! O trem foi até Presidente Epitácio, onde o próprio desceu para fazer um discurso de hora e meia e depois, puxado de volta para dentro do trem, "pelo amor de Deus", queixou-se que havia gente roncando durante sua fala. E voltaram já meio bêbados para São Paulo, onde se dispersaram, voltando para suas tocas (túmulos?) todos os ilustres passageiros, os belos tipos faceiros que estiveram lado a lado durante dois dias inteiros.

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